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Observadores de aves. E por que não, de anfíbios e répteis?


O questionamento é de Lucas Almeia, palestrante do Avistar 2023; herpetólogo incentiva a atenção aos anfíbios e répteis e relata como as pessoas que vão pra mata podem ajudar na descoberta de novas espécies Perereca-de-moldura (‘Dendropsophus elegans’) registrada em Cubatão (SP).
Lucas de Souza Almeida
Em uma das palestras do Avistar 2023, o biólogo Lucas de Souza Almeida, formado pela Unesp de Rio Claro (SP), perguntou ao público, predominantemente “passarinheiro”, sobre o que é possível observar na mata durante o período noturno, no qual as aves vão repousar.
Em meio aos cochichos e respostas como “vou atrás das corujas”, o mestre em Ecologia, Evolução e Biodiversidade, também pela Unesp de Rio Claro, alertou: “eu não sei o que vocês esperavam encontrar aqui nessa palestra, mas vou abordar os anfíbios e os répteis, ok? São eles que me deixam animado para ir à mata. Conforme fui conhecendo os grupos, eu comecei a amar e me aprofundar nesses animais”.
Lucas começou a apresentação com a intenção de conhecer a plateia. Para isso fez algumas questões e pediu que o público respondesse levantando as mãos.
Jararacussu (Bothrops jararacussu) flagrada em Cubatão (SP). Espécie é peçonhenta.
Lucas de Souza Almeida
Quantos de vocês já viajaram para outras cidades, estados e ou até países em busca de ver e registrar animais? Quais desses lugares vocês tiveram a oportunidades de conhecer ambientes ermos, como parques estaduais, nacionais ou naturais? Nesses momentos vocês encontraram algum anfíbio ou algum réptil? Aliás, algum de vocês tem medo, aversão, nojo, pânico, com anfíbios e répteis? Tem muita gente que sente nojo de sapo, mas eu acho esses animais lindos. Inclusive, eles são incríveis. Vocês conseguem dizer que espécie que era que vocês viram ou a qual grupo eles pertenciam? Não, né?”, detalhou o palestrante. Uma pessoa responde “jacaré” e Lucas descontrai “já é um começo”.
A intenção do biólogo na palestra era ressaltar a importância e a beleza desses animais. E o público, acanhado no início da conversa, foi aumentando. E as indagações continuavam.
“Vocês observaram como esses animais viviam? O que eles estavam fazendo? Como eles estavam se comportando? Notaram algo curioso? Algum comportamento inusitado? Por exemplo, já vi um anfíbio mostrar o “dedo do meio” pra mim. Falei “ué”, o que está acontecendo? Depois eu fui descobrir que existe um comportamento defensivo que eles levantam os dedos. Vai entender… É uma sinalização visual. Mas se você respondeu muitos “nãos”, eu quero saber o porquê”, disse Lucas.
Sapo-de-chifres (Proceratophrys boiei) registrado em Tapiraí (SP).
Lucas de Souza Almeida
A partir daí, ele quis mostrar que, assim como com as aves, não há a necessidade de irmos a lugares muito distantes para conhecermos uma variedade enorme de espécies de anfíbios e répteis.
“Nesses ambientes mais remotos do planeta que vocês tiveram oportunidade de conhecer, tenho certeza que vocês estavam em busca, principalmente, das aves, certo? Às vezes viajamos longas distâncias atrás de uma grande diversidade de espécies, porém existem lugares muito especiais, principalmente aqui no Brasil, que são hotspots e que estão pertinho da gente, como é o caso da Mata Atlântica e do Cerrado. Então não precisamos nos deslocar, por exemplo, até Madagascar, pra ver uma quantidade legal de bicho. A gente tem aqui no nosso quintal. Quero chamar a atenção de vocês pra isso”, posiciona.
BRASIL É UM HOTSPOT
Hotspot é uma área muito diversa, com grande variedade de espécies, muitas delas endêmicas, ou seja, exclusivas dessa região ou desse tipo de vegetação ou desse bioma, dependendo da nomenclatura. São áreas que sofrem pressão ou estão ameaçadas.
Jabuti-machado (Platemys platycephala) registrado no Parque Nacional da Serra do Divisor, em Mâncio Lima (AC).
Lucas de Souza Almeida
O Brasil é o país com maior diversidade de anfíbios e répteis do mundo. E há um grande potencial de que ainda surjam muitas novas espécies. Para compreender, em seis anos foram descobertas 183 espécies entre anfíbios e répteis. Em 2015 eram 773 répteis, depois em 2018 eram 795 e em 2021 já eram 838. Em 2016 eram 1080 anfíbios, depois em 2019 eram 1137 e em 20219 já eram 1188. “Reparem nesses números. Vejam a quantidade de espécies de répteis e anfíbios que temos. Inclusive, vejam quantas são endêmicas”, ressalta.
COOPERAÇÃO
Porém, segundo Lucas, para que os números de espécies descobertas continuem crescendo, é fundamental a cooperação dos observadores que frequentam as matas.
“Eu entendo que o “passarinhólogo” tem que acordar cedo. Não combina comigo, não julgo, só um pouquinho – brinca. Porém, peço que toda a disposição que vocês têm para “madrugar”, encontrar, registrar e catalogar as aves, vocês também deem atenção aos animais noturnos. É durante a noite que a temperatura começa a cair, a umidade começa a aumentar, a mata começa a criar cerração, a exposição aos raios solares diminui e o número de presas aumenta. Situações favoráveis aos anfíbios e répteis”, solicita.
Rãzinha-de-folhiço (Haddadus binotatus) flagrada em Guararema (SP).
Lucas de Souza Almeida
Estudos mostram que os bichos com maior possibilidade de descobertas de novas espécies de animais vertebrados no mundo, nos próximos anos, são os anfíbios e répteis. A partir dos anos 70 a herpetologia no Brasil e no mundo começou a ter uma atenção especial e tivemos um pico de descobertas de espécies. As aves, por exemplo, já tiveram o pico delas há muito tempo, “tanto que a taxonomia e a sistemática das aves já é robusta e bem completa, sendo algo já está bem estabelecido. É bem mais difícil aparecer espécies novas de aves do que de anfíbios e répteis e isso está atrelado à detecção desses animais. Por exemplo, é muito mais fácil você ver uma ave do que um sapinho. Pelo tamanho do corpo, pelo horário, pelo acesso, mas isso pode mudar”, afirma o estudioso.
Segundo Lucas, as observações nas matas podem direcionar os pesquisadores. “Vocês podem ser essa ponte entre o campo e o artigo científico. A taxonomia incipiente, recente, nova da herpetologia, é algo legal de trazer pra vocês para vocês verem que é possível que vocês estejam de frente com uma espécie nova. Tira foto, grava, manda pra gente, conversa com a gente”, pede.
Perereca-de-folhagem (Phyllomedusa burmeisteri) flagrada em Jundiaí (SP).
Lucas de Souza Almeida
E para Lucas as contribuições dos “desbravadores” não param por aí. Outro ponto possível de ajuda pode se dar a partir dos registros na parte de história natural desses bichos e da compreensão da distribuição geográfica desses animais.
“Afinal, se a gente ainda tem muita espécie pra conhecer, a gente ainda tem muita coisa pra entender. Onde esse bicho ocorre? Como ele ocorre? Por que ele ocorre? Como ele se reproduz? Depois que você descreve surgem várias outras questões e essa é uma dela, a distribuição geográfica. Por exemplo: ao encontrar, registrar um anfíbio e enviar a imagem para alguém mais entendido, mais inserido no meio, você pode colaborar com um artigo bem interessante. Porque primeiro, anfíbios são micro endêmicos, eles normalmente têm distribuição mais restrita que as aves. Eles se locomovem menos, são menores, são muito dependentes de áreas com umidade, então eles não vão cruzar uma estrada, não vão cruzar o Cerrado” explica.
Outro ponto sobre a compreensão de distribuição desses animais é sobre a ocorrência de espécies exóticas e invasoras. “São muitas. Isso não ocorre apenas com as aves. Está aí o pombo-doméstico. Nós vemos o bicho todo dia curtindo a vida no mundo inteiro. Os anfíbios e répteis também invadem. Por exemplo, têm anfíbios que habitam a América do Norte e a Central e já foram encontrados na Baixada Santista. Possivelmente se deslocando por navios”, comenta.
Jacaré-do-papo-amarelo (Caiman latirostris) fotografado em Rio Claro (SP).
Lucas de Souza Almeida
Lucas afirma que essas invasões podem ser perigosas por alterar a cadeia alimentar do local. “Nós não temos a dimensão disso, mas podemos descobrir a partir dos registros. Uma única foto levanta várias perguntas. O olhar atento de vocês é combustível para os artigos científicos. Esse tipo de observação é legal, então é isso que estou tentando incentivar”, provoca.
O palestrante ressalta também a importância da consciência dos desbravadores que toparem observar os anfíbios e répteis. “Vale lembrar que a proposta aqui é promover a observação desses animais, porém, ela precisa ser feita com cuidado e sem passar dos limites. Não devemos estressá-los, muito menos pegá-los. Anfíbios, por exemplo, são animais sensíveis e apenas com o toque é possível causarmos algum problema a eles, inclusive, transmitir doenças que estejam no ambiente, como o quitrídio. Além disso, não tocar e importunar os bichos é uma forma de se proteger também, pois muitas espécies podem não gostar do manuseio e se defender, podendo inclusive causar acidentes e quadros que precisem de hospitalização, já que existem animais que podem ser venenosos ou peçonhentos. Portanto, quero que observem, mas tendo essa responsabilidade e cuidado em mente”, adverte.
DESCOBERTAS
Você sabia que a onça-pintada foi registrada comendo uma tartaruga na década de 80? Ou que o primeiro anfíbio potencialmente polinizador do mundo foi descoberto agora, em 2023? Ambas revelações anunciadas a partir de registros de observadores em campo.
Cururuzinho (Rhinella ornata) encontrado em Guararema (SP).
Lucas de Souza Almeida
“Têm muitas espécies que faltam dados, ou até mesmo espécies que não sabemos nada. O registro em foto, vídeo, uma anotação, pode mudar isso completando essas lacunas. Existem poucas informações organizadas e acessíveis sobre anfíbios e répteis. Ao contrário das aves que temos bons livros, sites, aplicativos. Na herpetologia estamos longe disso. Então quando forem fazer essas atividades que estou propondo que vocês façam, tentem fazer com cuidado, com carinho pelos animais. Estações boas pra achar esses bichos são a Primavera e o Verão. Começou a chover? Esse é o momento. No tempo seco do Inverno dificilmente você encontrará esses bichos. Tome cuidado com animais peçonhentos. Na hora do registro saiba respeitar o espaço desses bichos. Portanto, recarreguem as lanternas, preparem suas câmeras, vistam blusas de mangas compridas e calcem suas galochas. Pois, enquanto as aves dormem, existe um mundo rico, inexplorado e próspero que vocês podem conhecer. Nele há muitas figuras que irão tirar autênticos sorrisos de vocês. E ainda podendo ter chances reais de contribuírem com o mundo da herpetologia de mais de uma forma. Mudar esse cenário é possível e necessário”, conclui. E aí, desbravador, vai ajudar nessas descobertas?
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