• https://www.vakinha.com.br/vaquinha/sos-chuvas-rs-doe-para-o-rio-grande-do-sul

      New Page 1

    RSSFacebookYouTubeInstagramTwitterYouTubeYouTubeYouTubeYouTubeYouTubeYouTubeYouTube  

As startups, os planos de stock options e o risco empresarial

O complexo e irritante arcabouço tributário brasileiro não é novidade para nenhum leitor. Quando o tema são as startups o cenário não é muito alterado. O Marco Legal das Startups (Lei Complementar 182/21) disciplinou o Inova Simples, alterando pontualmente o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (Lei Complementar 123/2006), conhecida também com a Lei do Simples Nacional.

A nova redação do artigo 65[1] criou o regime especial simplificado, concedendo às iniciativas empresariais, que se autodeclarem de caráter incremental ou disruptivas, rito sumário na abertura e fechamento de sociedades empresárias, no ambiente do Redesim[2]. O mesmo dispositivo legal determina a necessidade de abertura de conta corrente pela pessoa jurídica para o depósito dos valores a serem captados nas rodadas de investimento e integralização do capital social, e a necessidade de acrescentar no nome empresarial a expressão Inova Simples.

Mais interessante do que deixar explícito a quem negocia com a sociedade a juventude do empreendimento, a legislação impõe ao INPI[3] a prioridade no registro de patente e marca das startups, ativos importantíssimos, sem dúvida.

Pecou, acredito em nossa visão, o Marco Legal das Startups ao não conceder aos projetos inovadores maiores incentivos tributários, tais como alíquotas diferenciadas ou até isenções para empresas jovens com faturamento baixo e, pensando também na outra ponta, no ganho de capital de investidores nessas empresas inovadoras. A simplificação do sistema tributário por si só já seria de grande valia e os parâmetros a serem seguidos poderiam ser os da própria lei: faturamento e tempo desde a abertura da sociedade.[4]

Um ponto, poderia ter sido pacificado: a natureza mercantil das stock options e, consequentemente, a não incidência de verbas trabalhistas e previdenciárias na operação de outorga de ações à especiais colaboradores.

Explica-se: a atração de mentes brilhantes para uma startup não é tarefa fácil como vimos no segundo artigo desta série[5]. Entretanto, a necessidade do fundador de atrair capital intelectual para o sucesso do empreendimento é nítida e os planos de stock options, que incluem o vesting[6], ainda rendem discussão nos tribunais, a respeito da sua natureza mercantil ou trabalhista. A alteração legislativa poderia ter posto uma pá de cal no problema, consolidando a primeira opção que, se diga, vem sendo a mais aceita pela jurisprudência.

A discussão sobre os planos de outorga de ações é resumida na seguinte ementa[7]:

A partir de suas características, discute-se se o instituto detém natureza de remuneração ou de contrato mercantil, o que determinará a forma de tributação a ser aplicada. Para os tribunais trabalhistas, aos quais a questão tem se apresentado há mais tempo que na esfera tributária, os eventuais ganhos auferidos pelo empregado não têm natureza de remuneração porquanto presentes nos respectivos contratos a facultatividade, relativa ao exercício da opção de compra e da adesão voluntária ao plano, bem como a onerosidade, verificada pelo pagamento das ações no momento da opção, e o risco típico do acionista, à vista da incerteza do ganho futuro. Precedentes do TST. – Eventuais ganhos decorrentes do exercício da opção de compra não guardam semelhanças com as situações descritas no artigo 457 da CLT, pois não decorrem da aferição direta dos resultados apresentados pelo beneficiário nem de contraprestação ao trabalho. Podem ocorrer, ou não, a partir da valorização da empresa em razão de diversos fatores que não estão necessariamente atrelados à atuação daqueles que se tornaram acionistas. Assim, sob tal ótica, descabido considerar que o empregado é remunerado pelo trabalho prestado com as mesmas ações que paga para adquirir nos termos da outorga anteriormente acordada. Em tais casos, caberá apenas a tributação sobre o ganho de capital. (realce nosso)

Afora o artigo 168, parágrafo 3º, da Lei das Sociedades Anônimas[8] permitir a outorga de opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviço à companhia, nos parece que o maior argumento para a natureza empresarial se encontra no ponto central de toda a discussão: o colaborador assumir o risco do negócio junto com o empreendedor.

E assumir o “risco” é justamente o que o capital intelectual, que trabalha em uma empresa disruptiva, fez e faz apostando na sua valorização e no ganho futuro.  A empresa pode não prosperar, a relação laboral pode não se desenvolver a contento, a saída daquela posição pode ocorrer antes das condições descritas na opção de compra e não haverá qualquer ganho futuro.

Por outro lado, se as ações forem atribuídas ao colaborador sem a necessidade de aquisição e, havendo a opção de dizer “não as quero”, estar-se-ia diante de uma remuneração direta e, portanto, incidiriam as normas trabalhistas e previdenciárias[9][10], conforme prevê o artigo 457, da CLT[11].

Vale realçar que o recebimento de ações por empresa do grupo econômico fora da jurisdição brasileira, prática comum em startups, também gerará a necessidade de recolhimento de imposto de renda no ganho de capital[12].

O tema já foi bem discutido na jurisprudência, porém quanto maior a segurança jurídica, mais fácil a atração de talentos e, lógico, investidores. Assim, o Marco Legal das Startups poderia ter deixado clara a natureza mercantil dos planos de opção de compra de ações, bem como definiu que o imposto de renda somente incidiria na alienação de tais ações pelo colaborador em um evento de liquidez[13].

O ganho ou a absorção do risco serão certamente do colaborador, que aceitou o plano de stock options; caberá ao fundador, elaborar o melhor pitch[14] para atrair as mais brilhantes mentes.

De resto, “alea jacta est[15]”.

Para quem quiser saber mais, recomendo: WRIGHT, Alison Wright, BAKER, Alisa, CHERNOFF, Pam. The Stock Options Book. National Center for Employee Ownership, 23ª edição, 2023. English Edition.


[1].“Art. 65-A. É criado o Inova Simples, regime especial simplificado que concede às iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclarem como startups ou empresas de inovação tratamento diferenciado com vistas a estimular sua criação, formalização, desenvolvimento e consolidação como agentes indutores de avanços tecnológicos e da geração de emprego e renda.”

[2] Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios.

[3] Instituto Nacional de Propriedade Industrial.

[4] Art. 4º São enquadradas como startups as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados. § 1º Para fins de aplicação desta Lei Complementar, são elegíveis para o enquadramento na modalidade de tratamento especial destinada ao fomento de startup o empresário individual, a empresa individual de responsabilidade limitada, as sociedades empresárias, as sociedades cooperativas e as sociedades simples: I – com receita bruta de até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no ano-calendário anterior ou de R$ 1.333.334,00 (um milhão, trezentos e trinta e três mil trezentos e trinta e quatro reais) multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses, independentemente da forma societária adotada; II – com até 10 (dez) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia.

[5] “Inverno ou verão das startups: capital financeiro ou intelectual?”, publicado no site: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/inverno-ou-verao-da-startup-capital-financeiro-ou-intelectual-19052023, em 19 de Maio de 2023.

[6]Vesting é um instrumento contratual popularizado pelas startups que prevê uma aquisição progressiva de direitos sobre o negócio. Na prática, ele busca garantir que a participação de fundadores e funcionários nas ações da empresa seja compatível com o envolvimento real que eles tiveram no seu crescimento e sucesso. (www.dicionariofinanceiro.com. Acesso em 30/05/2023)

[7](STJ – REsp: 2008120 SP 2022/0177071-4, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Publicação: DJ 14/12/2022)

[8] Art. 168. O estatuto pode conter autorização para aumento do capital social independentemente de reforma estatutária. § 3º O estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com plano aprovado pela assembléia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.

[9] IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA FÍSICA (IRPF) Ano-calendário: 2008 IRPF. PLANO DE OPÇÃO DE COMPRA DE AÇÕES. STOCK OPTIONS. IDENTIFICAÇÃO DO FATO GERADOR. DATA DA CARÊNCIA INDEPENDENTE DO EXERCÍCIO DAS AÇÕES. IMPROCEDÊNCIA DO LANÇAMENTO. O fato gerador em relação ao plano de Stock Options ocorre pelo ganho auferido pelo trabalhador, quando o mesmo exerce o direito em relação às ações que lhe foram outorgadas. Com o exercício da opção, materializam-se todos os aspectos da hipótese de incidência, ou, na expressão adotada pelo CTN, ocorre o fato gerador da obrigação tributária. Improcedente o lançamento quando parte a autoridade fiscal de uma premissa equivocada de que o fato gerador no caso de stock options seria a data de vencimento da carência, independentemente do exercício das ações. Não há como atribuir ganho, se não demonstrou a autoridade fiscal, o efetivo exercício do direito de ações.

Numero da decisão: 2401-010.677

Decisão: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso voluntário. (CARF, Processo 13855.722703/2013-14, Primeira Turma Ordinária da Quarta Câmara da Segunda Seção, Relator: RAYD SANTANA FERREIRA, Data de publicação: 12/01/2023)

[10] CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS Período de apuração: 01/09/2008 a 30/09/2008 PLANO DE AÇÕES. STOCK OPTIONS. INEXISTÊNCIA DE CONTRAPRESTAÇÃO. GANHO OFERECIDO PELO MERCADO. NATUREZA MERCANTIL. O rendimento, nos planos de stock options, não é oferecido e nem pago ou creditado pela empresa, mas sim pelo mercado acionário, em decorrência do aumento do valor da ação em razão de fatores mercantis, inclusive de fatores macro e microeconômicos que fogem completamente ao controle da companhia.

Numero da decisão: 9202-010.506

Decisão: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso especial do contribuinte. No mérito, por maioria de votos, acordam em dar provimento ao recurso. (CARF, Processo n. 16682.721015/2013-46, 2ª Turma/Câmara Superior de Recursos Fiscais, Relator: JOÃO VICTOR RIBEIRO ALDINUCCI, Data de publicação: 09/02/2023).

[11] Art. 457 – Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.

[12] SOLUÇÃO DE CONSULTA DISIT/SRRF06 Nº 175, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2010 – (Publicado(a) no DOU de 13/01/2011, seção 1, página 13) 

ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Física – IRPF172

EMENTA: FATO GERADOR. AQUISIÇÃO DE AÇÕES. RENDIMENTO TRIBUTÁVEL. ALIENAÇÃO DE AÇÕES. GANHO DE CAPITAL. Configura rendimento tributável, oriundo de fonte situada no exterior, a concessão de ações por empresa estrangeira integrante de grupo econômico do qual faz parte a empresa brasileira, que contratou diretamente o empregado beneficiário, desde que a concessão tenha caráter habitual e natureza contraprestativa. Para fins de tributação, as ações, como rendimentos em espécie, serão avaliadas em dinheiro, pelo valor que tiverem na data da percepção. Ações cotadas em bolsa de valores e expressas em dólar deverão ser avaliadas na data da percepção e convertidas para real, utilizando-se o valor do dólar dos Estados Unidos da América fixado para compra pelo Banco Central do Brasil para o último dia útil da primeira quinzena do mês anterior ao do pagamento do rendimento. Na alienação das ações recebidas, impõe-se a apuração do ganho de capital obtido, devendo ser considerado, como custo de aquisição, aquele verificado no momento do recebimento das ações e, como valor de alienação, aquele auferido nessa operação em dólares dos Estados Unidos da América, com posterior conversão em reais, pela cotação do dólar fixada para compra pelo Banco Central do Brasil, para a data do recebimento. O ganho de capital deve ser tributado com utilização da alíquota de quinze por cento e recolhido até o último dia útil do mês subseqüente ao do recebimento.

[13] Os eventos de liquidez, também conhecidos como “exits”, são momentos importantes na trajetória de uma empresa em que os investidores têm a oportunidade de obter retorno sobre seu investimento e os fundadores podem realizar o lucro de anos de trabalho. https://dicionariodaeconomia.blogspot.com/, acesso em 30/05/2023

[14]Pitch, no sentido literal da palavra, quer dizer arremesso em inglês. Trazendo para o mundo do empreendedorismo, um pitch seria uma curta apresentação para vender uma ideia, projeto ou negócio, no intuito de despertar o interesse, muitas vezes de investimento, de quem está assistindo, é uma ideia de dialogar de  forma rápida e direta com quem se pretende comunicar. https://www.inovacao.usp.br/o-que-significa-pitch/, acesso em 30/05/2023

[15] A tradução comumente utilizada: “A sorte foi lançada”. A frase em latim foi proferida por Júlio Cesar quando atravessou o Rio Rubicão para tomar Roma de Pompeo.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.
#sosriograndedosul
Essa é uma oportunidade simples, segura, efetiva (e afetiva) de estender a mão e oferecer ajuda a pessoas que estão passando por dificuldades inimagináveis no Rio Grande do Sul, após as chuvas que castigaram o Estado.
Mais do que uma simples contribuição financeira, sua doação é um gesto de cidadania, solidariedade e humanidade. É a oportunidade de ser a luz no momento mais difícil de alguém.

 

https://www.vakinha.com.br/vaquinha/sos-chuvas-rs-doe-para-o-rio-grande-do-sul