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Em homenagem às mães que lutam por um mundo melhor

– Por que você está vestido assim? – espantou-se Rebeca.

– Assim como?

– Você não pôs terno completo quando André e Gustavo nasceram.

– Não vi André nascer. Vou ser pai de uma menina. Isso exige certa formalidade.

Rebeca entrou no carro e fomos para o Centro Clínico do Lago, em Brasília, onde dali a algumas horas nasceria Sofia. Era o dia 15 de março de 1984.

Tão logo Rebeca foi transferida da sala de cirurgia para o quarto, deixei-a dormindo na companhia da mãe e saí para entrevistar o ex-ministro da Casa Civil do governo João Figueiredo, o general Golbery do Couto e Silva.

Pensei que de volta à maternidade ainda encontraria Rebeca dormindo. Que nada! Estava acordada, furiosa comigo e chorava muito.

– Como você foi capaz de me abandonar numa hora dessas para ir trabalhar?

– Fui entrevistar Golbery. Não dava para desmarcar. A agenda dele é muito carregada…

Rebeca passou os três anos seguintes reclamando do que eu E repetindo como se fosse um mantra:

– Se existe licença-maternidade tem que existir licença-paternidade.

Aí foi instalada em Brasília a Assembleia Nacional Constituinte destinada a promulgar uma nova Constituição que marcasse a passagem do regime militar para o regime democrático.

– Vou escolher alguém para apresentar a emenda da licença-paternidade de 30 dias – avisou-me Rebeca.

– Esqueça. Ninguém vai topar. E se topar a emenda será rejeitada – antecipei.

Em uma noite de maio de 1988, jantávamos no restaurante Florentino quando Rebeca avistou o deputado paranaense Alceni Guerra.

– É ele, é ele – apontou excitada.

– É ele o quê?

– É o cara ideal para apresentar a emenda.

E explicou por quê: Alceni era homem. Se a autora da emenda fosse uma mulher, dificilmente ela vingaria. Alceni era médico, e pediatra.. O melhor: a mulher dele, Ângela, estava grávida. E o PFL de Alceni era um partido conservador, incapaz, portanto, de propor uma

Convidei Alceni para sentar-se à nossa mesa. Pobre Alceni! Sentou-se, bebeu, jantou e dividiu a conta ouvindo Rebeca falar sem parar das vantagens de o pai dispor de um mês para se dedicar ao filho recém-nascido. Quanto mais ele duvidava das chances de a emenda ser aprovada, mais Rebeca argumentava em favor dela.

– Está bem, Rebeca, vou pensar a respeito, mas 30 dias é muito tempo. Talvez cinco – disse Alceni, quase rouco de tanto ouvir.

– Na verdade, eu queria que a licença fosse de seis meses. Baixei para um – retrucou Rebeca.

Por coincidência, eu estava no Congresso no dia em que a Constituinte votou a emenda de Alceni.

– O senhor acha que essa emenda tem alguma chance de ser aprovada? – perguntei ao deputado Delfim Netto (PPB-SP).

– Sem chances. É uma maluquice.

Na hora de Alceni subir à tribuna para discursar, o deputado Ulysses Guimarães (SP), presidente da Constituinte, da Câmara e do PMDB, comentou ao microfone arrancando risos do plenário:

– Ah, tudo bem, licença para o pai. Precisa disso?

Alceni começou seu discurso contando a história de um casal de nordestinos que migrara para São Paulo, onde não tinha parentes nem conhecidos. Uma vez por lá, a mulher engravidou, pariu e cuidou sozinha do filho porque o marido trabalhava. A lei só lhe concedia um dia de folga.

Lá pelas tantas, depois de ter falado de sua experiência como pediatra e da importância da figura do pai na vida dos filhos, Alceni retomou a história do casal de nordestinos e provocou os que o escutavam:

– Quantas vezes casos como esse terão que se repetir para que o legislador se convença do direito que tem o pai de permanecer ao lado da mãe nos primeiros dias de vida de um novo filho?

Alceni deixou a tribuna sob aplausos. Vários colegas o cumprimentaram chorando. Ulysses pediu desculpas a Alceni pelo comentário debochado.

A emenda acabou aprovada por esmagadora maioria de votos. Virou lei desde que a Constituição foi promulgada em outubro de 1988. Sofia tinha então quatro anos.

Rebeca está atrás de um deputado ou senador sensível à ideia de apresentar um Projeto de Emenda à Constituição que estenda aos avós os benefícios da licença paternidade.

Ela acha que o assunto é urgente e relevante e que, portanto, poderia ser objeto de uma Medida Provisória assinada por Lula.

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