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‘Sinto um buraco’: mãe de aluno de medicina morto por serial killer de gays relata drama dois anos após crime


Marco Vinício Bozzana, ou Marquito como a família o chamava carinhosamente, foi morto aos 25 anos em um apartamento, em Curitiba. Dois anos após o fim trágico, a família sul-mato-grossense relembra memórias e a trajetória do jovem que tinha sonho de ser médico. Mãe relata viver luto dois anos após filho ser morto por serial killer de gays
Roselene Bozzana, de 51 anos, ainda confunde as conjugações dos verbos no presente ou no passado ao lembrar do filho Marco Vinício Bonanza, que foi morto em maio de 2021 por um serial killer de gays, em Curitiba. Dois anos depois da partida do primogênito, a mãe reúne forças para falar sobre a trajetória do jovem que tinha sonho de ser médico e construir uma vida independente junto de quem amava.
Para uma longa conversa, Roelene recebeu o g1 na casa onde Marquito, como a família carinhosamente chamava Marco, cresceu, viveu várias experiências e pôde compartilhar de vários momentos entre os familiares. Assista ao vídeo no começo desta reportagem.
Roselene, grávida de João, filho mais novo, e Marco chegaram para morar em um condomínio, no bairro Panamá, em Campo Grande, no início dos anos 2000. A casa foi escolhida a dedo, próxima ao parquinho para que os filhos pudessem crescer brincando. Superprotetora, como se autodefine, Roselene diz ter dito os filhos sempre “debaixo das asas”.
Marco morreu aos 25 anos.
Arquivo pessoal
“Vim para Campo Grande e o Marcos tinha quatro anos. Cheguei com um filho nos braços e outro na barriga. O Marquito cresceu aqui, queria um apartamento próximo ao parquinho. Sempre fui uma mãe vigilante, mas aconteceu isso”, relata Roselene apontando para o balanço, onde outras duas crianças brincavam.
Atualmente, com o filho mais novo, João Bozzana, de 23 anos, Roselene divide a vida entre uma fazenda em Piraputanga, distrito de Aquidauana (MS), e o apartamento na capital. Sempre que volta para Campo Grande, Roselene relata precisar de alguns dias para associar o ambiente.
“Tudo lembra lembra o Marquito aqui no apartamento, no condomínio. Meu filho sempre gostava de tirar uma selfie. Sempre que chego de Piraputanga, tem um dia que fico triste e pensando nos locais que meu filho passava. Em todo lugar tem um pedacinho do meu filho. Ele sempre dormiu comigo, sempre juntos. Nós éramos um tripé, bem unido. A separação só ocorreu quando ele foi para Curitiba. Ele estava seguindo o sonho dele”.
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Um dia após a morte
Marco cresceu em Campo Grande.
Arquivo pessoal
Marco morreu no dia 4 de maio de 2021. Durante à noite, por volta das 19h, Roselene mandou mensagem para o filho perguntando se ele estava acordado, a resposta veio minutos depois. O rapaz respondeu que tinha um trabalho da faculdade para finalizar e que estava cansado.
A final do Big Brother Brasil 21 marcava o dia, Juliette saiu campeã da edição. Ávido pelo reality show, Marco não comentou com os familiares ou com os amigos sobre a vitória da paraibana, o que já levantou a suspeita de que algo tinha saído da normalidade.
“Depois que recebi a mensagem, fiquei tranquila. Cedo, no dia 5, o pai dele ligou cedinho, mas não teve resposta. Depois de não ter a resposta, a preocupação ficou maior. Era o último dia do BBB e o Marco não tinha comentado nada, quando deu 8h da manhã e ele não tinha respondido, ficamos assustados”, lembra a mãe.
Roselene juntou alguns objetos de Marco em um quadro de memórias.
Arquivo pessoal
Roselene estava em Piraputanga quando recebeu a informação de que o filho não respondia as mensagens do pai. À caminho de Campo Grande, a mãe detalha como foi receber a notícia da morte do filho.
“Eu senti que alguma coisa errada tinha acontecido. Falei para o pai dele mandar arrombar a porta da casa, eu sabia que meu filho estava lá dentro. Chamamos o chaveiro, abriram e ele estava lá, morto. Quando cheguei, o pai dele me avisou. Já tinha chorado muito no caminho”.
Antes de saber que o filho tinha morrido, Roselene chegou a mandar mensagens no celular do jovem. Algumas foram lidas, como a mãe relembra. “Uma das mensagens chegou, mas ele [assassino] bloqueou o celular. O rapaz não tirou a foto do meu filho e depois bloqueou, acho que ele leu muitas coisas depois”, detalha.
Assim que descobriu a morte, Roselene enviou uma mensagem para o celular de Marcos. “Eu mandei uma mensagem para o rapaz [assassino], disse: ‘ você pode se esconder embaixo da terra, que a gente ia achar’. Essa mensagem foi lida e eu acho que foi o assassino. Depois dessa mensagem não chegou mais nada”.
Em todo canto, uma memória diferente de Marco.
Arquivo pessoal
No dia 6 de maio de 2021, de madrugada, Roselene e o pai de Marco saíram de Campo Grande e foram à Curitiba. Assim que chegaram na capital paranaense , a mãe e o pai de Marco foram diretamente ao Instituto Médico Legal reconhecer o corpo.
“No IML eu orava para Deus ressuscitar meu filho. Quando entrei para reconhecer o corpo, não reconheci, não achei que fosse meu filho. Só quando eu cheguei perto que a ficha foi caindo e vi que era ele. Hoje, depois de tudo que passei, tenho que tirar forças, não tem o que fazer”, comenta Roselene com lágrimas escorrendo pelo rosto.
Luto vivido diariamente
A taça de vinho que o filho comprou.
José Câmara
Dois anos após a morte do filho, Roselene diz que agora que começou a viver o luto. “Este ano está sendo mais difícil. Ano passado, com um ano da morte, eu tentei falar dele. Mas neste ano está diferente, não estou conseguindo externar. Este ano foi mais difícil. Está passando o tempo e minha ficha está caindo mais. Agora que estou vivendo e o tempo está passando, a falta é mais forte. Agora que estou vivendo o luto. Eu sinto a falta dele em tudo, meu filho é amor, quem não sente falta de amor e carinho?”.
Como forma de ficar próxima de Marco, a mãe se agarra aos objetos, lembranças e memórias que tinha com Marquito. “Uso e guardo tudo dele. Antes dele ir, ele comprou duas taças de vinho. Agora, só tomo vinho na taça que ele comprou. Tudo que faz lembrar ele me deixa mais próximo dele. Todo dia eu resgato as memórias. A coberta dele, que também tinha um pouco de sangue quando ele morreu, eu uso. Lavei a coberta e uso todos os dias”.
Roselene, João e Marco eram um tripé, como a mãe explica. Os sonhos, desejos e vontades sempre eram divididos entre os três. Desde criança, Marco queria ser médico e rico, como Roselene comenta.
Roselene guarda com carinho foto que tirou com os dois filhos.
José Câmara
“Eu e o João sempre apoiamos os sonhos do Marquito. Não tínhamos luxo, tudo que ganhávamos ia para ele. O sonho de nós três era que meu filho mais novo terminasse a faculdade e depois íamos embora para Curitiba”. Mesmo após a partida do filho, Roselene e o filho mais novo pretendem continuar os sonhos sonhados com Marco, como o de irem morar em Curitiba.
Dia a dia, Roselene diz buscar forças para encarar o que ela considera anormal. “Quando você confia em Deus é mais fácil de passar pelas situações. Você perder um filho não é normal. É um buraco que fica, um vazio. Tenho que tentar preencher este vazio todos os dias. Não é a ordem da vida. Os outros continuaram a normalidade depois do primeiro dia, eu via as pessoas em situações normais e eu não. Não conseguia entender. Nunca mais vou ser a mesma. Só quero que a pessoa pague, na Justiça de Deus e dos homens”.
Homofobia
Marco também foi vítima de homofobia, relata mãe
Roselene tinha medo que o filho criasse relacionamentos por aplicativos. A conversa sobre a homessexualidade veio de forma tardia, relata a mãe de Marco. Para ela, o filho, além de assassinado, foi vítima de homofobia. Assista ao vídeo acima.
Antes, a orientação sexual era um tabu na casa de Roselene. “Eu percebi que meu filho não estava bem, não tinha aprovação da mãe que ele amava, idolatrava tanto. Quando teve um Globo Repórter sobre o assunto, eu pensei: ‘um filho tão maravilhoso e fico com essa bobagem’”.
Depois do programa, Roselene detalha uma conversa que teve com o filho. A mãe foi ao quarto de Marco, abordou o assunto e, após, “a vida fluiu perfeitamente”.
“Meu filho passava por homofobia, tinha medo do que os outros iam fazer com ele. Fui conversar com ele e me abri com ele. Nós choramos juntos, pedimos perdão um para o outro, tirei um peso das minhas costas. Depois disso foi só alegria. Não tinha mais o que esconder, me contava tudo. Nós conversávamos sobre tudo”.
Memórias e trajetórias
Helena e Marco.
Arquivo pessoal
Foi em 2017 que Marco conheceu a enfermeira Helena Queiroz. Ambos estavam no cursinho pré-vestibular, os dois tinham o sonho de trilhar as vidas na área da saúde. Na sala de preparação, nasceu uma amizade.
Helena relembra que mesmo quando Marco foi para Curitiba cursar medicina, a amizade permaneceu a mesma. “A gente era alma gêmea, nos dávamos muito bem. Mesmo a distância, nós conversávamos todos os dias. Sempre foi muito perceptível a nossa conexão. Fazíamos planos para a vida, sabíamos que íamos ficar juntos para vida”.
Mais que amigos, para Helena, Marco era ‘porto seguro’.
Arquivo pessoal
A mãe de Marco acompanhou a trajetória do filho para alcançar o sonho de cursar Medicina. Ao todo foram três anos de cursinho.
“Acompanhamos a luta dele durante três anos, as tentativas de passar no vestibular e as dificuldades. Foram três anos ele tentando passar para medicina. Passou em odonto, enfermagem, fisioterapia e, por fim, passou em Medicina. Ele falava que estava correndo atrás do sonho dele, até que ele conseguiu. Meu filho estudava muito, muito esforçado. Nós ficávamos juntos, nas lutas e felicidades”, lembra Roselene.
Comemoração foi muita quando Marco passou em medicina.
Arquivo pessoal
Quando Marco passou na faculdade que sempre quis, a felicidade foi imensa, como detalha Roselene. “Ele chegou em casa e me falou o que tinha passado. Ele veio todo pintado e começou a me abraçar e levantar, comemoramos juntos a vitória dele, que era nossa também. A alegria foi contagiante. Mesmo com a alegria, eu já fiquei preocupada. Meu filho ia sair do ninho, não ia ficar mais debaixo dos meus braços”.
Entenda o caso
Serial killer acusado de matar homossexuais é condenado
O corpo de Marco foi encontrado no dia 5 de maio. Foi a partir daí que a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) descobriu a série de crimes que estão sendo atribuídas ao mesmo suspeito.
O serial killer de homossexuais José Tiago Correia Soroka foi condenado a 104 anos, quatro meses e seis dias de prisão por latrocínio, roubo agravado, extorsão e homofobia. A decisão, de sexta-feira (8), é da juíza Cristine Lopes, da 12ª Vara Criminal de Curitiba.
Soroka está preso desde 29 de maio do ano passado. À época, a polícia informou que ele confessou três crimes dos quais ele era suspeito, mas ainda investigava se ele havia cometido outros assassinatos.
Os policiais conseguiram chegar até Soroka a partir de uma vítima que sobreviveu. O crime aconteceu no dia 11 de maio do ano passado, no Bigorrilho, e o rapaz foi importante nas investigações.
Soroka também foi condenado ao pagamento de 229 dias-multa, aproximadamente R$ 9,2 mil. As investigações apontam que o suspeito usava aplicativos de encontros para ir até a casa das vítimas.
Durante o encontro, ele estrangulava os homens e deixava o local levando pertences deles.
Segundo a polícia, os elementos do interrogatório demonstram que os crimes possuem motivação por ódio, e que o suspeito pretendia fazer uma vítima por semana.
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