Quando o ditador da Coreia do Norte lançou sua mais recente peça de propaganda do regime há duas semanas, nem ele poderia prever que se tornaria um grande sucesso no TikTok. Friendly Father “Paizinho Amigável” viralizou nas redes sociais, com usuários da Geração Z dançando ao som desta música de ritmo eletrônico.
A maioria desses usuários ignora o significado da letra, a qual elogia um homem que ameaçou “aniquilar completamente” os Estados Unidos, violou as sanções da ONU e lançou múltiplos mísseis balísticos. A música declara: “Vamos louvar Kim Jong-Un, o grande líder / Vamos nos orgulhar de Kim Jong-Un, nosso pai amigável”.
“Taylor Swift não esperava ser surpreendida tão rapidamente após o lançamento de seu novo álbum”; “Esta música merece um Grammy”, “É tão distópica de uma maneira cativante” – esses são apenas alguns dos comentários entusiasmados nos vídeos sobre o assunto no TikTok. Os especialistas afirmam que por trás da ensolarada música pop há algo mais sinistro. Vamos analisar isso mais detalhadamente.
Ao produzir um sucesso na Coreia do Norte, é necessário considerar mais do que apenas questões comerciais – é crucial buscar maneiras de penetrar nas mentes, afirma Alexandra Leonzini, uma acadêmica da Universidade de Cambridge que estuda a história musical do país.
Não há espaço para frases abstratas ou ritmos excessivamente complicados. As melodias devem ser simples e acessíveis – algo que as pessoas possam compreender facilmente. A melodia também deve ser ajustada para um alcance vocal que todos possam alcançar ao cantá-la.
Além disso, o país raramente produz faixas musicais que transmitam emoção. “A ideia é que eles querem motivar a nação a lutar por um objetivo comum para o benefício da nação. Eles não costumam produzir músicas como baladas”, afirma Leonzini. Na Coreia do Norte, há tolerância zero para as artes ou a criatividade fora do controle estatal. É ilegal que músicos, pintores e escritores produzam obras simplesmente por amor à arte.
Segundo Leonzini, toda produção artística na Coreia do Norte deve estar voltada para a educação da classe cidadã e, mais especificamente, para instruí-los sobre a importância de cultivar sentimentos de gratidão e lealdade para com o partido. O governo da Coreia do Norte segue a “teoria da semente”, que postula que cada obra de arte deve conter uma semente ideológica, uma mensagem que é posteriormente disseminada em massa.
De acordo com especialistas, os cidadãos da Coreia do Norte começam seus dias ao som de canções de propaganda que ecoam pelas praças das vilas. As partituras e letras das músicas recém-lançadas são frequentemente publicadas em jornais e revistas, enquanto a população é geralmente incentivada a aprender danças para acompanhar o ritmo. Keith Howard, professor emérito de musicologia da Coreia do Norte na Universidade SOAS de Londres, destaca esse fenômeno.
Outra música não é novidade quando se trata de ser dedicada a Kim. No entanto, a distinção está na mudança notável na linguagem e no vocabulário empregados.
Pela primeira vez, Kim está sendo referido como “pai” e “o Grande” – termos que anteriormente eram reservados ao primeiro líder da Coreia do Norte, seu avô Kim Il-Sung. Inicialmente, Kim foi chamado de “Grande Sucessor” quando assumiu o cargo em 2012, após a morte de seu pai, Kim Jong-Il.
Entretanto, mais de uma década depois, os analistas especulam que a designação de “Friendly Father” pode ser um sinal de que ele está tentando consolidar sua imagem como o “Líder Supremo” da Coreia do Norte.
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