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    AGÊNCIA JF | Social - Repositório

Mães atípicas detalham histórias de vida e os desafios da maternidade

“Tem assuntos que ainda dói falar e me emociono muito em outros”. Essas foram algumas das palavras usadas por Gabriela Vier ao se abrir para contar a própria história de vida. Moradora de Porto Belo, em Santa Catarina, a influenciadora da equidade e empregada doméstica é mãe de quatro filhos diagnosticados com o transtorno do espectro autista (TEA). Assim como os rebentos, a mãe de Mayra, de 16 anos, Enrico, com 4, e das gêmeas Betina e Cecília, de 7, também tem o distúrbio no desenvolvimento neurológico.

Neste domingo (12/5), o Brasil celebra o Dia das Mães. Na data comemorativa em que se abraça, acolhe e presenteia a figura materna, a Coluna Claudia Meireles buscou ouvir mães atípicas que inspiram outras, seja na própria comunidade, seja por meio de conteúdos postados na internet. Essas histórias se cruzam pelo seguinte quesito: são mulheres não medem esforços para tornar o mundo melhor aos filhos e para eliminar as barreiras impostas a eles por terem algum tipo de deficiência, doença, síndrome ou transtorno.

Foto colorida de homem e mulher rodeados por três meninas e um menino. Atrás deles tem um árvore de Natal - Metrópoles
A família Vier em clima natalino

“Viver um dia de cada vez”

Diante de tantas histórias, a coluna deu até um rasante na Alemanha para escutar o relato de Daiane Zauner. Com 38 anos, a influenciadora e pós-graduanda em neurociência é mãe de Luna, de 6 anos, e de Maya, com 4, que tem síndrome de Down. No primeiro momento, a descoberta de que a caçula teria a trissomia do cromossomo 21 foi um “choque”. “No início, eu não conseguia acreditar. Com o tempo, meu coração estava me dizendo que era isso mesmo e eu não precisava de mais um exame para acreditar”, narra.

“O mais importante é que meu marido, a Luna e eu amamos a Maya desde o primeiro segundo. Claro que ficamos muito assustados devido aos problemas de saúde que ela poderia ter em decorrência da trissomia, mas, nós apenas passamos a viver um dia de cada vez, curtindo a nossa bebezinha”, enfatiza Daiane. A mãe notou que os médicos alemães não passavam tantas informações sobre a síndrome de Down e passou a buscá-las na internet.

Foto colorida de mulher sentada em muro com rio atrás. Ela está abraçada a duas meninas - Metrópoles
Daiane com as duas filhas, Luna, de 6 anos, e Maya, com 4

Ao ver que outras crianças com trissomia 21 faziam terapias, Daiane insistiu com o pediatra que encaminhasse Maya para um fisioterapeuta e fonoaudiólogo. “Sentia que essas terapias eram precárias”, recorda.

Quando a caçula estava perto de completar 2 anos, Daiane e a primogênita, Luna, desembarcaram no Brasil: “Na primeira consulta com o doutor Zan Mustacchi, eu tive uma verdadeira aula sobre 21”. Ela acrescenta: “Em apenas três meses de fisioterapia com a médica Roberta Mustacchi, a Maya não só ficou de pé, como até mesmo começou a dar os primeiros passinhos”, lembra.

“Doce e superbrasileirinha”, a menina de 4 anos alcança conquistas no desenvolvimento, conforme lista a mãe: “Maya consegue se comunicar razoavelmente em dois idiomas, português e alemão, inclusive dá um show na cara de quem diz ou pensa que ela é incapaz de fazer algo por conta da síndrome de Down”.

Daiane, então, começou uma pós-graduação em neurociência focada na trissomia 21 para auxiliar a filha da melhor maneira. “Enxerguei que o bom desenvolvimento da Maya realmente dependeria muito de mim, da nossa família e dos estímulos e oportunidades que ela recebesse”, relata.

Foto colorida de mulher segurando bebê no colo - Metrópoles
Daiane segura a caçula no colo

“Propósito de ser mãe”

Também foi a busca por conhecimento que moveu e move Gabriela Vier, diagnosticada com autismo e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Atualmente, a mãe de quatro filhos cursa a faculdade de educação inclusiva. A primogênita, Mayra, é autista nível 2 de suporte e tem TDAH. Já Cecília dispõe do nível 1 de TEA, enquanto Betina apresenta o nível 2, além de TDAH, transtorno desafiador opositor (TOD) e a doença autoimune alopecia. Caçula da influenciadora, Enrico é autista nível 2 de suporte.

Gabriela tem uma página pessoal no Instagram há uma década. Ela não esperava que o perfil fosse “bombar” ao falar sobre autismo: “Toda semana, eu recebo uma mensagem dizendo: ‘Graças aos seus vídeos, meu neto está em investigação. Meu filho foi diagnosticado’”.

Ao ler esses feedbacks, a influenciadora da equidade admite ter encontrado o “propósito de ser mãe de quatro autistas”. “Não conseguimos mudar o mundo, mas conseguimos transformar a vida de uma pessoa, de duas e do município”, frisa.

Foto colorida de mulher abraçada a duas meninas - Metrópoles
Gabriela Vier com as gêmeas Cecília e Betina

“Por meio da Betina veio a lei para a nossa cidade de Porto Belo que permite a liberdade do cão de assistência acompanhar as pessoas com deficiência em todos os lugares”, partilha Gabriela. Aprovado no último dia 3, o projeto 38/2024 assegura o ingresso das pessoas com deficiência e seus cães de assistência em locais de uso público ou privado no município catarinense. Na avaliação da mãe de quatro crianças, quanto mais visibilidade der para autistas e deficientes, mais irá se “abrir portas” que, até então, poderiam estar fechadas.

“Ter um mundo mais feliz”

Do outro lado do Brasil, mais precisamente em Roraima, está a costureira Elismar Carneiro, mãe de 10 filhos, entre eles, as gêmeas Eloá e Elis, que completaram 3 anos no último dia 4. As meninas nasceram com a síndrome Hutchinson-Gilford, doença ultrarrara que acelera o processo de envelhecimento em torno de sete vezes em relação ao índice normal. A suspeita de que a dupla tivesse uma possível condição de saúde veio aos quatro meses, entretanto “os sinais começaram a aparecer” um tempo depois.

Foto colorida de homem e mulher, cada um segurando uma bebê. Eles estão em uma festa infantil com o tema Galinha Pintadinha - Metrópoles
Elismar com os filhos Guilherme, Elis e Eloá

Embora Eloá e Elis tivessem nascido prematuras, o botão da desconfiança na mãe atípica acendeu ao observar que as filhas apresentavam a boca e nariz bastante pequenos. “Tivemos certeza de que elas tinham alguma síndrome depois dos sete meses, pois começou a cair o cabelo, as veias ficaram mais visíveis e o corpo passou a dar sinais da doença”, rememora. Elismar conta que o diagnóstico da síndrome — também conhecida por progeria — só foi cravado em 2022, com a entrega do laudo.

“As duas são um encanto, um amor de pessoa”, descreve Elismar. Enquanto Elis é uma criança muito brava, com um lado mais carinhoso e atencioso, Eloá tem um “jeitinho só dela”. “Estar ao lado” das gêmeas se tornou a maior satisfação para a costureira, enquanto o tópico mais desafiador é ser uma mãe melhor a cada dia: “Procuramos sempre fazer o nosso melhor para que elas possam ter um mundo mais feliz. Buscamos dar o nosso máximo a fim de que se sintam mais amadas do que já são”.

Foto colorida de duas meninas sentadas em poltrona. Elas têm a síndrome progeria - Metrópoles
Com 3 anos, as gêmeas Elis e Eloá têm personalidades diferentes

“Aprendi a ser mãe”

Em Brasília, há duas mães atípicas que fazem de tudo para garantir que os filhos sejam, sobretudo, felizes e independentes. Uma delas é Hedrienny Cardoso, de 38 anos, corresponsável pela criação de três crianças. Ela vive na capital federal há mais de 16 anos. Em janeiro de 2012, veio ao mundo o seu primogênito, Daniel, atualmente com 12 anos. Mãe de primeira viagem, a rotina passou a ser recheada de consultas médicas para acompanhar o desenvolvimento de Dan, como o apelidou carinhosamente.

Quando o menino completou 2 anos, veio um sinal de alerta em uma das idas ao pediatra de Daniel. “O médico observou que o Dan não acompanhava a luz e os objetos. Passamos a marcar consultas com vários oftalmologistas para entender qual era a raiz do problema”, relembra a mãe. Foram em torno de oito atendimentos médicos até a mãe receber o diagnóstico de que o primogênito é deficiente visual. O garoto tem a amaurose congênita de Leber, uma rara doença degenerativa hereditária da retina.

Foto colorida de mulher e homem com dois meninos e uma menina. Eles estão em um jardim - Metrópoles
A família reunida!

Daniel fez 1 aninho e Hedrienny engravidou da segunda filha, Júlia, atualmente com 10 anos. Aos 12 meses de vida, a menina também foi diagnosticada com a mesma doença do irmão. “Não sabia que ela também poderia nascer com essa deficiência. Embora seja a mesma condição, tudo na Júlia era mais fácil, desde o começo, porém eu não entendia o motivo”, detalha a mãe. As diferenças comportamentais entre as duas crianças chamaram atenção de uma tia materna.

Wanessa Cardoso acreditava que o sobrinho poderia ter alguma condição que afetava o desenvolvimento neurológico. A princípio, desconfiaram que o garoto poderia ter o transtorno do espectro autista (TEA), tempos depois houve a confirmação, conforme partilha a mãe: “Quando Daniel completou 3 anos, veio o diagnóstico de autismo e tivemos de aprender a conviver com outras limitações”. No ponto de vista de Hedrienny, a principal dificuldade em ser mãe de duas crianças com deficiência nada tem a ver com as necessidades de cada um.

Foto colorida de três crianças posando para foto. Elas estão sorridentes - Metrópoles
Júlia, Pedro e Daniel são filhos de Hedrienny Cardoso

Segundo Hedrienny, a pior parte é esbarrar na falta de inclusão e acessibilidade. “Como mãe, eu me envolvi na escola, conversava com os professores e não me acomodava para oferecer as melhores ferramentas para meus filhos enfrentarem o mundo”, explana. Foi um desses incentivos, mas vindo da família, que coincidentemente transformou a vida de Daniel. O menino visitava a casa de um parente materno e aparentou estar agitado. Como forma de acalmá-lo, sugeriram dele brincar com o teclado.

“Ele sentou e, surpreendentemente, tocou uma música de primeira”, salienta a mãe. Hedrienny afirma que a música deu um novo sentido para a vida de Daniel. Sem medir esforços para se aprofundar no novo interesse do primogênito, a mãe descobriu que Dan tinha ouvido absoluto, um fenômeno auditivo em que o indivíduo é capaz de identificar e recriar notas musicais. “Quando perguntam para ele quem o ensinou a tocar teclado, ele responde que fui eu. Acho graça, porque não sei tocar nada. Só incentivei”, relata.

Foto colorida de menino e mulher abraçados tirando uma foto - Metrópoles
Hedrienny Cardoso com o primogênito, Daniel

Três anos após a gestação de Júlia, Hedrienny deu à luz Pedro. O terceiro filho desafiou o que revelava o seu mapeamento genético. O caçula nasceu sem deficiência. “A minha maternidade atípica foi com o Pedro, porque aprendi a ser mãe do Daniel e da Júlia. Eu tive que me educar para ser mãe do Pedro também”, narra. Embora exponha a própria história com leveza, Hedrienny atesta ter atravessado um momento de luto por precisar assimilar as dificuldades e entender que “não é o fim do mundo”.

“Fazer uma história”

Aprender foi uma palavra que norteou (e ainda norteia) a maternidade de Adriana Moreira, mãe de Mateus Moreira, atleta de 23 anos. Também de Brasília, ela soube da condição do filho no terceiro mês de gravidez. Ele foi diagnosticado com mielomeningocele e hidrocefalia. Por conta da má-formação na coluna, o jovem usa cadeira de rodas: “Na hora em que soube que meu filho tinha mielomeningocele e hidrocefalia, levei um susto. O maior impacto foi o medo do desconhecido, porque eu nunca tinha ouvido falar sobre a doença”, recorda.

Foto colorida de homem em cadeira de rodas ao lado de duas mulheres - Metrópoles
Mateus Moreira com a mãe, Adriana, e a irmã, Júlia Beatriz

Passado o abalo inicial, Adriana teve de lidar com a falta de informação e conselhos negativos: “Sugeriram aborto. Disseram que ele teria muitos problemas e não viveria mais de dois anos. E se vivesse, seria em estado vegetativo. Decidi que não importava o tempo e como ele passaria comigo, mas seria o suficiente para fazer uma história.”

Na avaliação da mãe, a decisão de manter a gestação a transformou em uma “pessoa pesquisadora, incansável e empática”. Ela acrescenta: “Sempre procuro saber tudo sobre a deficiência dele”

Com 23 anos, Mateus não só silencia, mas também quebra as barreiras e vence os obstáculos de quem dizia que ele não sobreviveria aos 2 anos de idade. Ao olhar a trajetória de sucesso percorrida pelo filho, Adriana se sente realizada. O jovem atua como modelo, é skatista e cursa a faculdade de jornalismo. “Uma pessoa com deficiência pode fazer tudo dentro das suas limitações. Hoje, Matheus é um exemplo de força, garra, vontade e, sobretudo, exemplo de uma pessoa feliz”, finaliza.

Foto colorida de homem com deficiência em cima de um skatista - Metrópoles
A mãe de Mateus Moreira sente orgulho ao ver tudo o que filho já realizou

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