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A utilização de lawfare na Revisão da Vida Toda

A batalha pela justiça e pelos direitos previdenciários no Brasil é marcada por uma série de desafios, entre eles, a prática insidiosa conhecida como lawfare. Esse termo, que combina “law” (lei) e “warfare” (guerra), descreve a utilização do sistema legal e dos processos judiciais como armas políticas para perseguir e enfraquecer adversários. Um exemplo vívido desse fenômeno é observado na ação judicial conhecida como Revisão da Vida Toda, um direito dos aposentados lesados pelo INSS que tem sido alvo de manipulação e manobras jurídicas questionáveis.

A Revisão da Vida Toda refere-se à possibilidade de incluir no cálculo da aposentadoria os salários de contribuição anteriores a julho de 1994, data de implantação do Plano Real. Tal medida visa corrigir distorções que penalizam trabalhadores que tiveram seus maiores salários antes desse período, resultando em benefícios previdenciários inferiores aos que teriam direito. Em 1º de dezembro de 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) havia decidido favoravelmente quanto ao mérito da Revisão da Vida Toda, reconhecendo o direito dos aposentados a uma aposentadoria mais justa.

A Revisão da Vida Toda nada mais é do que a possibilidade de optar pela regra permanente de aposentadoria pelo INSS, quando a transitória (que foi criada para abrandar a chegada de uma nova legislação) for mais desvantajosa. Como bem definiu o relator, ministro Alexandre de Moraes, é o direito de usar a regra geral em seu cálculo, tendo tratamento igualitário com a maioria das pessoas que irão se aposentar. Algo extremamente básico e justo, sem qualquer discriminação ou vantagem.

No entanto, a implementação desse direito tem sido obstruída por práticas de lawfare, minando a decisão judicial e prejudicando milhares de beneficiários. Entre as táticas utilizadas estão:

  1. Manipulação da opinião pública: Números hiperinflados do custo da ação de Revisão da Vida Toda são divulgados na mídia pelo governo federal, criando uma narrativa de que a tese representa um ônus insustentável para os cofres públicos. Essa estratégia busca deslegitimar a demanda dos aposentados e influenciar a opinião pública contra eles. Estudos apontam um custo estimado de R$ 3 bilhões em dez anos, enquanto que, no processo junto ao STF, o INSS anexou inicialmente nota técnica no valor de R$ 46 bilhões e, pasmem, com o passar do tempo, o governo tem difundido para a mídia o estratosférico valor de R$ 480 bilhões. Um número claramente desproporcional, infundado e irreal.
  2. Resgate de ações antigas: Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) de 1999 foi recentemente resgatada e utilizada como embargos infringentes para anular o recurso extraordinário 1.276.977 (Tema 1102), que havia garantido o direito à Revisão da Vida Toda. Tal manobra jurídica busca criar obstáculos legais e rever decisões judiciais já consolidadas. Destacamos que as ADIs sequer tratavam do tema, sendo ações propostas para discutir o fator previdenciário e o salário-maternidade. Por meio delas, que constituem ações que não tinham como objeto a Revisão da Vida Toda, sete ministros do STF, em julgamento de 22 de março de 2024, tentaram anular uma anterior decisão colegiada de repercussão geral, do próprio STF, de 1º de dezembro de 2022, que foi a favor da Revisão da Vida Toda.
  3. Mudança na composição do colegiado: ministros favoráveis à Revisão da Vida Toda se aposentaram, e uma nova composição do colegiado do STF é formada por membros que tendem a ser mais conservadores ou alinhados aos interesses do governo em conter o custo da demanda. Isso impacta diretamente na interpretação e no julgamento de casos relacionados à Previdência Social e à Revisão da Vida Toda, no caso aqui abordado.

Essas práticas de lawfare não apenas minam a confiança no sistema judicial, mas também representam uma grave violação dos direitos fundamentais dos cidadãos. Ao utilizar o direito como uma arma política, os responsáveis pelo lawfare comprometem a Justiça e perpetuam injustiças sociais, prejudicando aqueles que mais necessitam da proteção do Estado.

A utilização do lawfare foi um dos pontos levantados, em 2023, na sabatina do ministro Cristiano Zanin – hoje contrário à Revisão da Vida Toda e aos direitos dos aposentados – quando indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao STF. Na época, Zanin foi questionado sobre como um ministro da corte poderia combater o uso de lawfare

A resposta de Zanin foi: “Um magistrado não deve combater nada”, “Acredito que não podemos aceitar [o lawfare]”. Seu posicionamento foi o de que juízes não devem ter como orientação de sua atuação o combate direto e proativo a fenômenos políticos e sociais. Na sua ótica, é papel do STF garantir a aplicação da Constituição, que indiretamente poderia significar combater o lawfare

Ao afirmar que tal prática se combate com o respeito à legislação, se entende que o lawfare é a própria negação do Direito em sua compreensão contemporânea.

A pergunta realizada para o ministro em sua sabatina se deu pelo fato de ele já ter escrito obra sobre o tema e ser, inclusive, um dos fundadores do Instituto Lawfare, em 2017.

Para combater o uso abusivo do lawfare e garantir a efetivação dos direitos previdenciários, é fundamental uma atuação conjunta da sociedade civil, das instituições democráticas e do próprio Judiciário. É preciso denunciar e resistir às práticas que visam manipular o sistema legal em detrimento dos direitos dos cidadãos, promovendo uma cultura de justiça e igualdade perante a lei. A Revisão da Vida Toda é apenas um exemplo de como a luta por direitos pode ser distorcida e obstruída, mas é também um lembrete da importância de permanecer vigilante e engajado na defesa da justiça social.

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