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Crianças desnutridas e famílias sem moradia: entenda as condições de indígenas venezuelanos em Cuiabá


Quatro crianças morreram por doenças relacionadas à falta de saneamento básico e higiene, desde que 50 famílias da etnia Warao chegaram na capital, há quatro anos. Atualmente, os Warao vivem em condições precárias em um terreno na capital
Famílias de indígenas venezuelanas da etnia Warao estão vivendo em condições precárias em Cuiabá. Atualmente, cerca de 300 nativos vivem na capital e, desde que chegaram, quatro crianças morreram por doenças relacionadas à falta de saneamento básico e higiene. Eles vivem em barracos improvisados e dependem de doações de alimentos para sobreviverem.
A líder da etnia, Hernaida Rivera Estrella, contou que eles não estão conseguindo alimentos e muitas crianças estão com febre e gripe.
“Não temos onde morar, sinto muita dor no meu coração como mãe, como estrangeira e algumas vezes choro de preocupação e pensando nas dificuldades. Somos pessoas humildes, humanos de corpo e sangue. Pessoas que se aproveitam de nós não têm coração, porque estão em seu lugar, em seu terreno, no seu país e nós não. Fico pensando quando vamos melhorar dessa situação”, disse.
Os Warao começaram a chegar em Cuiabá em 2020. Inicialmente, ficaram acampados próximo à rodoviária. Dali, foram para o Bairro Tijucal e ficaram em casas alugadas com muitas pessoas morando dentro de um mesmo imóvel.
Os Warao vivem em barracos improvisados no Bairro São José
TV Centro America
Depois de serem despejados do local, uma solução temporária seria uma casa no Bairro São José, na região do Coxipó, e o empréstimo dos terrenos vizinhos para acolher outras famílias que foram chegando. Eles vivem nesse local até hoje.
A professora e pesquisadora de Língua Portuguesa da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Marcela Brito, acompanha os Warao desde 2022 e iniciou o doutorado com uma tese sobre os indígenas venezuelanos em Cuiabá. Segundo a pesquisadora, o que motivou eles a saírem do país de origem foi a busca por uma vida melhor.
“Vieram da Venezuela devido à crise ambiental causada pela exploração petrolífera, pela crise política e econômica que os privou de uma vida digna e os expôs a insegurança alimentar, falta de insumos para sobrevivência e escassez dos serviços públicos. Andaram muito para chegar em Cuiabá sempre em busca de uma vida digna”, disse.
Porém, eles enfrentam diversas dificuldades, começando pela barreira linguística. Os Warao falam a língua nativa da etnia ou o espanhol. Poucos aprenderam português e entendem o idioma. Outra dificuldade é de se instalarem em um terreno ou ter uma moradia.
“Os Warao sobrevivem com a venda dos artesanatos, pedidos de ajuda nos semáforos e centros bancários, uma pequena parte que domina o português conseguiu ingresso no mercado de trabalho”, contou Marcela.
Condições precárias e mortes
Os indígenas vivem há cerca de quatro anos em Cuiabá
Por ocuparem o terreno no Bairro São José, construíram barracos improvisados de lona, sem paredes, água tratada e energia elétrica. Dividem o espaço com o esgoto que corre no chão, não há banheiros, bebem água da torneira e, com a chuva, acabam perdendo colchões e redes usadas para dormir.
Com isso, estão expostos a doenças e contaminações. Desde que a etnia chegou na capital, quatro crianças morreram devido à essas condições.
Duas crianças Warao morreram quando os venezuelanos moravam no Tijucal, em 2022. Uma outra criança de um ano e cinco meses morreu em 2023. Na última sexta-feira (12), uma criança de três anos morreu devido a um grave quadro de desidratação e possível infecção.
“Entre as causas estão quadros severos de desnutrição e desidratação, infecção por exposição à locais insalubres. A insegurança alimentar reflete diretamente na saúde dessas crianças. Muitas apresentam quadro recorrente de vômito e diarreia, estão com desnutrição severa e não possuem alimentação regular. Ficam expostas às infecções, e o local tem muitos mosquitos, com riscos de contrair dengue entre outras doença”, relatou Marcela.
Justiça determinou que o município realizasse atendimento médico aos indígenas nessa quarta-feira (17)
Ministério Público de Mato Grosso (MPMT)
Na quarta-feira (17), o Ministério Público de Mato Grosso (MPMT) fez um pedido para que a Prefeitura de Cuiabá realizasse, com urgência, uma ação para verificar as condições de saúde da população indígena. O pedido foi aceito pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
Foram montadas duas tendas no local para atendimento médico. Profissionais das áreas de pediatria, dermatologia, psicólogo, nutricionista, fisioterapeuta, assistente social, educadora física, enfermeiros, técnicos de enfermagem, cirurgião dentista e técnicos em saúde bucal estiveram no local. Os casos mais graves foram encaminhados para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA).
Hernaida contou que atualmente só possuem arroz e macarrão para comer.
“Precisamos de ajuda para comprar fralda, comida porque não temos o que comer. Tem arroz e macarrão, mas não tem ovo, peixe e isso que precisamos”, contou.
Indígenas relataram que só estão comendo arroz e macarrão
TV Centro América
A assistência pública aos indígenas se intensificou em 2023 com a atuação das secretarias do município com entrega de sacolões, cadastro nos programas sociais, mutirões para atendimento de saúde e ações voluntárias de pessoas e grupos.
O padre e antropólogo da UFMT Aloir Pacini também faz um trabalho voluntário de assistência e acompanhamento dos Warao. Segundo o padre, os indígenas estão vivendo em condições muito graves.
“Por mais que as crianças sejam levadas aos postos de saúde, elas voltam por não ter um lugar adequado para morar. Há uma urgência em conseguir um lugar para fazer as casas, com espaçamento adequado, piso, telhado para que quando chova, não entre água, não molhe as camas e redes”, disse.
Em uma reunião realizada em 2023 entre o Ministério Público de Mato Grosso e a Prefeitura de Cuiabá, a Secretaria Municipal de Assistência Social se comprometeu com a entrega de 32 cestas básicas mensais aos Waraos. Já a Secretaria Estadual de Assistência Social (Setasc) disse que faria a entrega de 50 cestas básicas mensais aos indígenas.
Terreno cedido
Indígenas visitaram a área cedida pela prefeitura no dia 1° de março
Ministério Público de Mato Grosso (MPMT)
O terreno temporário em que os indígenas estão ocupando possui um proprietário e foi feito um acordo para que eles pudessem ficar no local até que tenham uma área para morar. Porém, o os indígenas teriam até esse domingo (21) para desocupar a área.
A Prefeitura de Cuiabá doou um terreno de 3,5 hectares, localizada próximo ao novo Hospital Júlio Muller, na MT-040, para que os indígenas se instalem no local. No dia 1° de março, os Warao e o poder público fizeram uma visita para avaliar as condições do local.
Os Warao apresentaram uma carta às autoridades com 19 reivindicações. A lista incluiu a construção de casas para as famílias morarem, implantação de saneamento básico, eletricidade em todas as casas, instalação de contêiner para coleta de lixo, apoio para implantação de quintal produtivo e materiais necessários, linha de crédito popular para aquisição de bens domésticos essenciais, entre outras providências.
Indígenas foram até a área para avaliar as condições
Ministério Público de Mato Grosso (MPMT)
De acordo com Aloir, os indígenas gostaram do local, porém, a área é alagada e eles não têm autorização para cortar árvores e limpar o terreno para a construir casas.
“Fomos lá, mas toda vez que a gente tenta ir para ocupar, não pode cortar árvore para fazer casa ou vai para dentro da lagoa. A prefeitura não da autorização para que se possa construir as casas pra eles. A melhor parte do terreno tem dono e a pior parte é dentro da lagoa. Não dá para morar”, disse.
Hernaida contou que devido a esse impasse, eles optaram por permanecer no Bairro São José até que o problema seja resolvido.
“Todo mundo está vendo que a terra não é boa. O lugar oferecido pelo prefeito está cheio de água, não podemos ficar lá, limpar porque falaram que as árvores não podem ser retiradas. Por isso nós permanecemos aqui. Tem que ser um terreno que pode ser limpo, alto para morar. Queremos a autorização para limpar o terreno”, disse.
Cerca de 50 famílias vivem no terreno
TV Centro América
Por causa do prazo de despejo, o Ministério Público se reuniu novamente na segunda-feira (15) para debater sobre a transferência dos indígenas para a área cedida.
Na reunião, ficou deliberado que a Secretaria Municipal de Assistência Social deveria informar, dentro de 24 horas, a adequação emergencial da Unidade de Acolhimento Municipal Manoel Miráglia, localizada no Bairro Borda da Chapada, para recebimento dessas famílias. O município também se comprometeu em verificar a real situação da área apresentada aos Waraos.
O MP determinou que a prefeitura terá que apresentar também, em até 10 dias, uma nova área pública para avaliação e aprovação dos venezuelanos.
O que diz a prefeitura e o governo
A Prefeitura de Cuiabá informou por meio de nota que está em andamento o cumprimento do acordo com o Ministério Público para transferência emergencial e provisória das famílias para a unidade de acolhimento institucional para adultos Manoel Miraglia. Segundo o órgão, a unidade está sendo adaptada para receber essas famílias. Sobre o terreno, a prefeitura disse que a regularização está em andamento.
“A Procuradoria Geral do Município (PGM) está realizando buscas em cartório para fazer a regularização da área e garantir segurança jurídica em todo processo”, diz. (nota completa abaixo)
Já o governo de Mato Grosso, por meio da Secretaria Estadual de Assistência Social e Cidadania (Setasc), disse que realiza mensalmente a entrega de 60 cestas de alimentos para os indígenas venezuelanos, sendo 50 para os acampados no Bairro São José, e 10 no Jardim Passaredo. A última entrega foi realizada no dia 9 de abril deste ano e, que no dia 19 de março, a Setasc também entregou, além das cestas, 80 latas de leite em pó e 60 pacotes de fraldas.
Leia abaixo a nota da prefeitura da íntegra:
Essas famílias venezuelanas indígenas estão situadas na zona de atendimento do Centro de Referência em Assistência Social (Cras) Getúlio Vargas e são assistidas pela Secretaria Municipal de Assistência Social, Direitos Humanos e da Pessoa com Deficiência desde o mês de novembro de 2022;
De lá pra cá, as equipes do Cras de referência realiza visitas contínuas, a fim de atender as demandas e necessidades desse público.
De acordo com o relatório do Cras, as famílias já recebem o benefício de R$ 600 a R$ 1.200; as famílias já estão inseridas e cadastradas no CadÚnico para recebimento de benefícios eventuais, bem como toda a orientação de caráter preventivo.
A unidade da Prefeitura contactou a Funai e a Sesai, em visita ao local, com seus profissionais, para referenciar essas famílias e oferecer toda a gama de serviços socioassistenciais da pasta.
Estamos trabalhando para cumprir os prazos estabelecidos, sendo 15 dias para deixar a unidade em condições adequadas para recebê-los. Enquanto as tratativas para a realocação são executadas, os indígenas estão recebendo apoio através de outros programas. Eles estão devidamente referenciados no Cadastro Único e recebem auxílio do Programa Bolsa Família, do Ser Família Indígena, além de estarem sendo beneficiados com cestas básicas estaduais.
A Secretaria está acompanhando de perto a situação e empenhados em garantir o bem-estar e a assistência adequada aos beneficiários afetados.
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