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Famílias de SP vivem expectativa por aprovação no Brasil de remédio milionário para tratamento de distrofia rara: ‘Metade do caminho’


Audiência pública nesta terça (30), na Câmara dos Deputados em Brasília (DF, discute a autorização do medicamento que está em análise desde outubro de 2023 pela Anvisa. Murilo Gabriel de 4 anos à esquerda e Victor Hugo de 6 anos à direita
Arquivo Pessoal
Famílias da região de Campinas (SP) vivem um drama em busca de um tratamento para os fihos com diagnóstico de Distrofia de Duchenne (DMD), condição rara com sobrevida reduzida, mas cuja esperança em impedir a progressão da doença repousa em um medicamento milionário em processo de autorização pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde 2023.
Nesta terça-feira (30), a partir das 9h, ocorre uma audiência pública na Câmara dos Deputados em Brasília (DF) para debater a autorização do medicamento no Brasil. Neste mês, o Ministério da Saúde emitiu ordem no valor de R$ 17,2 milhões para a compra do “Elevidys” para o tratamento de um menino de 5 anos, morador de Varginha, no Sul de Minas.
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Aprovado em junho de 2023 nos Estados Unidos, o “Elevidys” é um medicamento que atua no nível genético, produzindo uma proteína essencial chamada distrofina, que os pacientes com a distrofia muscular não conseguem produzir adequadamente.
Tamires Mayara da Costa, de 29 anos, moradora de Sumaré (SP), é mãe do Murilo Gabriel de apenas 4 anos e diagnosticado com a Distrofia de Duchenne, vai acompanhar a audiência. Para ela, a aprovação do uso do medicamento no Brasil é um alento para famílias que lutam contra a doença.
“Seria metade do caminho andado, porque se a gente puder ter um medicamento disponível aqui no Brasil, facilita tanto nessa briga judicial, né? Tanto no fato dele tomar mesmo, né? A gente não precisar mudar ele de país, mudar toda a rotina para ele poder tá tomando esse medicamento”, diz Tamires.
Quem também acompanha de perto o cenário é Mônica Gisele, 42 anos, mãe do Victor Hugo, de 6 anos. A família de Americana (SP) busca tratamento adequado desde o primeiro ano de vida do filho e corre contra o tempo, uma vez que a recomendação do medicamento é para uso até essa faixa etária.
Corrida em busca do medicamento
Após uma convulsão febril quando Murilo tinha cerca de um ano de idade, foi iniciado uma jornada de busca e investigação para saber o que a criança tinha. Logo após uma série de exames e consultas, perceberam uma alteração na enzima do fígado Murilo que persistia.
Murilo Gabriel, de 4 anos, mora em Sumaré (SP) e foi diagnosticado com a doença
Arquivo Pessoal
Uma biópsia do fígado foi realizada para tentar identificar alguma doença no órgão, e logo depois, a médica neurologista que fazia o acompanhamento do menino decidiu fazer uma enzima muscular, um exame mais específico, e o resultado veio com alteração.
Com isso, a profissional já desconfiou que poderia ser uma doença neuromuscular. Em seguida, realizaram um exame genético e veio o diagnóstico: Distrofia Muscular de Duchenne.
“A gente ficou sem chão […] Primeiro, porque eram poucas informações e, segundo, que são informações totalmente assustadoras, né? De que o nosso filho teria uma expectativa de, no máximo, até 20 anos. Que em pouco tempo, ele estaria precisando de uma cadeira de rodas”, relata Tamires.
Com o diagnóstico da doença em mãos, os pais começaram a procurar por especialistas e a dar início ao tratamento. E foi então que encontraram uma médica em São Paulo (SP) que falou sobre um medicamento chamado Elevidys, uma droga que trabalha removendo o RNA de um vírus e substituindo-o por um material genético alternativo que pode gerar a proteína distrofina.
Segundo a mãe de Murilo, a criança ainda apresenta poucos sintomas clínicos, como dificuldade para subir escadas e correr. Além disso, ele se cansa mais facilmente do que as outras crianças.
Logo após terem o conhecimento do remédio, os pais entraram com um processo para que a União pudesse efetuar a compra do medicamento, que iniciou em março deste ano, quando o pequeno completou 4 anos.
Tamires Mayara e Murilo Gabriel, mãe e filho, correm contra o tempo para conseguir medicamento milionário
Arquivo Pessoal
Além do processo, começaram uma campanha “Salve o Mumu” na internet para a arrecadação do valor em dinheiro. A iniciativa começou no final de março deste ano e até a última atualização da reportagem eles tinham arrecadado R$ 9,5 mil.
Avaliado na faixa dos R$ 15 milhões, a compra do remédio representaria, considerando a renda atual da família e o custo sem qualquer correção, cerca de 83 anos de trabalho para a compra sem ajuda. Isso não considerando outros gastos, como moradia, alimentação e contas da casa.
Para Tamires, a espera tem se tornado “um processo angustiante”. Com o valor elevado do medicamento e a necessidade de aprovação no Brasil, tudo se torna ainda mais difícil.
“É extremamente doloroso. A gente se sente muito impotente, né? Por não conseguir fazer alguma coisa pelo nosso filho nesse momento, a não ser esperar as medidas que a gente poderia tomar.[…] Tem sido agoniante saber que toda vez que ele cai sem nenhum motivo, isso dói muito na gente, porque a gente vê no dia a dia essa doença se desenvolvendo, né?”, conta a mãe do menino.
No caso do Murilo, a doença foi herdada de Tamires, que logo após o diagnóstico do filho, realizou um exame que identificou que é portadora da doença, mas pelo fato de ser mulher, a doença não se desenvolveu.
E quando o tempo está “acabando”?
Já no caso da família do Victor Hugo, quando o menino tinha apenas um ano e dois meses, Mônica notou algo diferente em seu desenvolvimento.
Apesar de andar na idade esperada, ele caía frequentemente e não utilizava as mãos para se proteger, resultando em machucados recorrentes no rosto e no corpo. Preocupada, a mãe buscou orientação médica e iniciou uma jornada em busca de respostas.
Os pais Mônica e Hugo Rikato, a irmã Isabella e Victor Hugo
Arquivo Pessoal
Após um período sem obter um diagnóstico preciso, a família decidiu levar a criança para um neuropediatra quando ele tinha dois anos e alguns meses.
Durante a consulta, ao realizar o exame físico e “apalpar” a panturrilha, a médica percebeu que estava enrijecida, o que levantou a suspeita de que Victor poderia ter uma doença neuromuscular. Em seguida, foi solicitado um exame de sangue, cujo resultado confirmou o diagnóstico.
“Receber o diagnóstico foi muito difícil, porque nós nunca tínhamos ouvido falar em doença neuromuscular, nem distrofia muscular, nem ‘Duchenne’, nem ‘Becker’, nada disso. Confesso que nas primeiras semanas, logo depois do diagnóstico, eu fiquei completamente travada”, relata a advogada.
No caso de Victor Hugo, a doença não foi herdada da mãe. Ela realizou um exame junto com sua outra filha e não foi detectado o gene.
Família de Victor Hugo, de 6 anos, espera por aprovação e extensão de faixa etária do medicamento
Alexandra Thomann
Apesar do diagnóstico ter sido feito relativamente cedo, os pais não conseguiram o medicamento a tempo. “Nós ficamos muito esperançosos no ano passado quando o medicamento foi aprovado pela FDA. Isso foi em junho ou julho do ano passado, e o Victor Hugo tinha 5 anos. Então ele estava elegível, mas em outubro ele completaria 6 anos”.
“Tínhamos pouco tempo para entrar na Justiça e conseguir esse medicamento, mas infelizmente não tivemos tempo hábil”, declara Mônica.
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Diagnóstico e tratamentos da doença
Ao g1, o médico neurologista e professor da Unicamp, Marcondes Cavalcante França Junior, explicou que as distrofias musculares são doenças genéticas, na qual o paciente, seja adulto ou criança, não é capaz de produzir uma determinada proteína que compõe o músculo esquelético dele.
Quando há falta dessa proteína específica, o músculo vai sofrendo um processo de degeneração e de desgaste, podendo causar perda de força, fraqueza, e que vai evoluindo com a piora gradual ao longo do tempo.
A distrofia muscular de ‘Duchenne’ é a mais comum em crianças e que afeta basicamente meninos. É uma doença ligada ao cromossomo X e começa a ser percebida pelos pais ou professores aos 4 e 5 anos de idade.
“A criança tem dificuldade para correr, dificuldade para pular, saltar, tem quedas frequentes, né? Então, esse é a primeira coisa que chama atenção geralmente”, conta o médico neurologista.
A criança pode vir a ter alguns sintomas, que são:
Desenvolvimento motor atrasado – leva mais tempo para aprender a sentar, ficar em pé e andar;
Os músculos da panturrilha podem ficar aumentados, comparado com as outras crianças;
Há fraqueza muscular, que vai piorando com o tempo;
A criança pode ter o costume de andar na ponta dos pés ou andar
Costume de andar na ponta dos pés ou andar balanceando;
Há também necessidade de utilizar as mãos para levantar.
Segundo o especialista, as crianças começam a usar cadeiras de rodas um pouco depois dos 10 anos e a sobrevida é reduzida, podendo a chegar até a terceira década de vida, causada por complicações da doença.
Há uma atrofia progressiva dos músculos, deixando o corpo atrofiado e fraco, em uma fase mais avançada, o paciente chega a não conseguir mais se mexer. Nessa fase, há necessidade do uso de aparelhos para ajudar na respiração.
Ainda de acordo com o neurologista, o tratamento é basicamente feito por corticosteroide, que são medicamentos da cortisona. Os remédios são orais e retardam a evolução do quadro, mas mesmo fazendo de forma correta, a doença evolui.
Há também a reabilitação com fisioterapia motora e respiratória, além do acompanhamento com fonoaudiologia.
O neurologista explicou que a produção dos medicamentos para doenças neuromusculares se baseia em uma terapia gênica. Na fabricação, é utilizado um vírus benigno, chamado adeno-associados, onde é retirado o DNA e no lugar é colocado o DNA que gera a proteína que a criança não produz. O remédio é injetado na veia, e logo em seguida, vai se espalhando pelo corpo.
“Ele vai, em tese, levar para musculatura da criança, aquela cópia do DNA para que ele volte a produzir a aquela proteína que ele não faz”, explica Marcondes.
No caso do “Elevidys”, a proteína que é produzida por esse vírus, não é a distrofina. Ela é bem parecida, mas não exatamente a mesma.
“Tem uma chance de ajudar bastante [pacientes com a doença], mas como é uma coisa muito nova, a quantidade de pacientes que foram tratados ainda pequeno, o tempo de acompanhamento, às vezes, é muito pequeno”, finaliza o médico.
O que diz o Ministério da Saúde e a Anvisa?
Procurada pelo o g1 sobre o andamento da aprovação do medicamento, a Anvisa informou que a audiência é uma iniciativa da Câmara para debater o Tratamento da Distrofia Muscular de “Duchenne” e que a avaliação técnica está em curso.
Além disso, disse que “se trata de uma competência privada da agência e que ao final da análise técnica, a decisão será publicada”.
“O pedido de registro foi apresentado para a Anvisa em 30/10/2023. O produto está em análise pela Anvisa de forma prioritária, mas não é possível antecipar datas antes do fim da análise técnica. A análise técnica é um processo técnico e complexo que tem com finalidade verificar se a relação de benefício e risco para a indicação pretendida está comprovada pelos dados disponíveis”, afirma a nota.
Já o Ministério da Saúde, informou que o medicamento está em análise de forma prioritária, mas não é possível antecipar datas antes do término da análise técnica. Veja posicionamento:
“O medicamento “Elevidys” (Delandistrogeno Moxeparvoveque) é um produto de terapia gênica. O pedido de registro foi apresentado à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 30/10/2023. O produto está em análise de forma prioritária, mas não é possível antecipar datas antes do término da análise técnica. A análise técnica é um processo complexo cujo objetivo é verificar se a relação de benefício e risco para a indicação pretendida está comprovada pelos dados disponíveis.
Atualmente, o medicamento possui registro apenas na agência reguladora americana Food and Drug Administration (FDA) em caráter experimental e condicional. Por não possuir, até o momento, registro na Anvisa, no Brasil, o medicamento não atende a nenhum dos critérios para incorporação e, portanto, não pode ser fornecido no âmbito das políticas públicas do Sistema Único de Saúde (SUS), conforme estabelecido pela Lei nº 8.080/1990.”
A nota do Ministério ainda finaliza que “são escassos os estudos clínicos que avaliaram e demonstraram a eficácia e segurança do delandistrogene moxeparvovec para o tratamento da Distrofia Muscular de Duchenne (DMD). Não há demonstrações consistentes de benefício clínico com o uso desta tecnologia. Sem o devido respaldo da segurança sanitária, conforme as regras de pesquisas clínicas e os princípios e diretrizes da bioética, não há embasamento técnico suficiente para a disponibilização de qualquer tecnologia em saúde.”
*Sob supervisão de Fernando Evans
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