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Madonna criou receita de show usada por Beyoncé e Taylor Swift, com banda camuflada e teatralidade


Cantora que se apresentará na Praia de Copacabana (RJ) é precursora de estilo de mega espetáculo; entenda a origem dessa e de outras estéticas que marcaram a história da música. Montagem com as cantoras (da esq. à dir.) Taylor Swift, Madonna e Beyoncé
Stephanie Rodrigues/g1/Kevin Mazur/WireImage/Timothy McGurr/AP
Cantora que neste sábado (4) se apresentará no Rio de Janeiro, Madonna foi a primeira artista a fazer um show com os mesmos ingredientes dos musicais da Broadway, o teatro mais famoso do mundo.
Na turnê mundial “Blond Ambition” (1990), ela testou (e aprovou) uma receita que reúne blocos temáticos, efeitos visuais, encenação teatral, coreografia arrojada, troca de figurino, cenário ambicioso e banda camuflada.
Desde então, o formato se cristalizou nas indústrias da música e do show business, virando a principal referência de mega espetáculo — replicada hoje por nomes como Beyoncé, Taylor Swift e Blackpink. Assista ao vídeo abaixo.
Madonna criou receita de show usada por Beyoncé e Taylor Swift
Digno de Broadway
Ao contrário do que rolava nos shows de rock da época — em que a banda era o centro das atenções —, os instrumentistas de “Blond Ambition” ficavam no canto do palco, quase escondidos.
O formato é semelhante ao dos teatros da Broadway, que têm uma área reservada à orquestra, separando os músicos dos atores, que ocupam todas as extensões do palco.
Além de performances dramáticas, Madonna teatralizou o show com um roteiro. Dividida em cinco atos (e três interlúdios), a apresentação trazia uma narrativa com início, conflito, clímax e fim.
Madonna em show da turne ‘Blond Ambition’, em 1990
Sean Kardon/AP
Em entrevista à revista “People” em 1990, o coreógrafo da turnê, Vincent Paterson, disse que Madonna tentou, a partir de “Blond Ambition”, reinventar o conceito de show.
“Em vez de apenas apresentar músicas, queríamos combinar moda, Broadway, rock e arte performática.”
A ideia deu certo. Não apenas porque arrecadou mais de US$ 60 milhões, mas também porque foi fisgada pelo público.
“O show é produzido como se as raízes [de Madonna] estivessem na Broadway, não na MTV”, escreveu na época Richard Harrington, crítico musical do jornal The Washington Post.
“Os holofotes estão sempre claramente voltados para a estrela, embora às vezes envolvam seus nove dançarinos de apoio. Os cenários e sons são espetaculares e a coreografia é tão importante quanto a música.”
Madonna durante a abertura da The Celebration Tour na The O2 Arena, em Londres, em 14 de outubro de 2023
Kevin Mazur/WireImage for Live Nation via Reuters
A ambição da loira
Ambiciosa, Madonna pegou carona no modelo dos shows grandiosos que já estavam pipocando e acrescentou sua fórmula teatral a ele. É justamente isso que diferencia “Blond Ambition” das apresentações que Michael Jackson vinha fazendo desde os anos de 1980.
Os shows do rei do pop — reinado que, aliás, ele divide com Madonna —, esbanjavam acrobacias e danças impressionantes. Não à toa, eternizaram passos como o moonwalk.
Ainda nos anos 1980, houve o auge da carreira de Prince, músico que também inovou na maneira de fazer shows pomposos, seja pelos seus looks exuberantes transformados em conceito musical, ou pela persona multifuncional que ele assumia no palco.
“Michael e Prince contribuíram para esse padrão de show. Eles tinham uma bagagem da cultura do rock, banda, virtuose, canto, instrumento. Cultura que Madonna também tem, só que adicionada a outras coisas. Ela coloca teatralidade”, explica em entrevista ao g1 Mariana Lins, especialista em música pop.
Cartaz fictício de ‘Blond Ambition’
Arte g1/ Ana Moscatelli/ Barbara Miranda
A era da pulseirinha
“Hoje, a gente tem recursos audiovisuais cada vez mais sofisticados e pulverizados. Mas, sinto que estamos chovendo no molhado, do ponto de vista da transformação”, afirma Mariana.
Colocar pulseirinha pisca-pisca no pulso da plateia sincronizada às batidas do show — Coldplay que o diga — é inovador em termos tecnológicos, mas não chega a propor um novo conceito de mega espetáculo, segundo a especialista.
Ela diz haver uma estagnação do “padrão Madonna”, que é reproduzido principalmente por artistas pop, o que, inclusive, tem a ver com a raiz do gênero.
Madonna e Maluna no Billboard Music Award 2019
Chris Pizzello/Invision/AP
“A música pop tem identificação muito grande com teatralidade, fabulação, fantasia e, naturalmente, com o ‘padrão Madonna'”, diz ela. “Desde a disco music, há um apelo cênico que vai além da virtuose musical. É o DNA do pop.”
A proposta do mega espetáculo plantada por Madonna também é vista — seja na íntegra ou parcialmente — em outros gêneros.
O rapper Kanye West, por exemplo, lançou “Donda” num show hiper teatral, em 2021.
Até mesmo bandas de rock passaram a explorar elementos do formato após o marco de “Blond Ambition”, diz Mariana, citando U2, grupo que em 2009 fez uma turnê com palco de 360º graus.
A especialista ressalta, porém, que o conceito de mega espetáculo cristalizado por Prince, Michael e, sobretudo, Madonna também é fruto de outros processos históricos.
“Não se trata de inventar a roda, mas sim de ir inovando as rodas.”
Os primeiros shows em estádios
A paternidade dos mega shows também é dividida por John, Paul, George e Ringo. E o empresário Brian Epstein.
Antes, os Beatles tocavam para 3 mil fãs no máximo, mas resolveram se arriscar. A partir de 1965, o quarteto passou a tocar em estádios e arenas com público entre 15 mil e 60 mil pessoas, na Europa e nos Estados Unidos.
O show mais famoso dessa fase foi no Shea Stadium, em Nova York. Cerca de 56 mil fãs foram ao estádio de beisebol no dia 15 de agosto de 1965. A banda passa a maior parte do tempo rindo e com cara de quem não está entendendo nada.
Cartaz fictício de show dos Beatles no Shea Stadium
Arte g1/ Ana Moscatelli/ Barbara Miranda
“Foi a primeira vez que um desses estádios foi usado para um show de rock. A Vox fez amplificadores de 100 Watts… a gente foi de 30 para 100 watts, mas mesmo assim não foi o suficiente”, explicou George Harrison, citando a empresa de equipamentos musicais.
Segundo o guitarrista, o som era amplificado só por caixas de som próximas do palco. Por isso, quem não estava perto teve dificuldade de ouvir algo além dos berros dos fãs.
“Eu nunca pensei que as pessoas tivessem vindo para ouvir o show. Elas queriam nos ver. O volume dos gritos ficava por cima de tudo”, resumiu Ringo Starr, resignado. O baterista contou que a banda mal conseguia se escutar.
Residência: vários shows no mesmo lugar
Antes dos mega shows beatlemaníacos, artistas ganhavam dinheiro com residências. A ideia era fazer várias apresentações seguidas no mesmo teatro.
Entre março e julho de 1961, os Beatles fizeram 92 (!) shows no The Top Ten Club, em Hamburgo, na Alemanha. Cinco anos antes, Elvis Presley ficou duas semanas cantando no New Frontier, em Las Vegas. O pioneiro do formato, no entanto, foi Liberace. O pianista americano emendou sequências de apresentações na cidade a partir de 1944.
Cerca de 100 anos antes, outro pianista ganhou a alcunha de primeiro popstar da história: o húngaro Franz Liszt (1811-1886). Ele tocava sem ler partituras, improvisava e foi responsável pela popularização dos recitais de piano.
Cartaz fictício de show de Franz Liszt
Arte g1/ Ana Moscatelli/ Barbara Miranda
Revolucionário da música clássica, ele se apresentava acompanhado de orquestras em teatros europeus.
Mas a idolatria foi além da música: era comum fãs lutarem por luvas, mechas de cabelo e lenços do músico.
Fãs também tinham o costume de gritarem e chorarem em suas performances. Toda a euforia foi resumida pelo termo “Lisztomania” e essa incrível história inspirou a banda francesa Phoenix na criação de seu maior hit, em 2009.
Eventos na ‘era do rock’
Para a revista “Billboard”, a era do rock começou em 1955, com “(We’re Gonna) Rock Around the Clock”, do Bill Haley & His Comets. O rock se consolidou como a trilha da juventude, dez anos após o fim da Segunda Guerra Mundial.
Três anos antes, em 1952, o estilo já mostrava força. Em março, o radialista Alan Freed realizou o “Moondog” Coronation Ball, evento batizado com o apelido dele.
Cartaz do festival americano Moondog Coronation Ball, de 1952, evento pioneiro do estilo
Reprodução
Para especialistas, foi o primeiro festival de rock da história. O amadorismo, no entanto, dominava: mais de 20 mil pessoas compareceram à Cleveland Arena, no estado americano de Ohio, para ver atrações como o grupo The Dominoes. A falsificação de ingressos e a distribuição de entradas por patrocinadores quase terminou em tragédia.
Nada disso se compara ao show que os Rolling Stones fizeram em Altmont, nos Estados Unidos, em 1969, mesmo ano do festival Woodstock. O evento organizado pela banda tinha os motoqueiros do Hell’s Angels como seguranças. Uma pessoa foi assassinada, muitos ficaram feridos e o episódio fez com que a estrutura de mega shows fosse repensada.
A criação da juventude
No livro “A Criação da Juventude” (2008), o jornalista inglês Jon Savage foi atrás da pré-história da cultura jovem, entre 1875 e 1945.
Em setembro de 1944, a revista “Seventeen” chegou ao mercado norte-americano com uma mistura de “moda e beleza jovem, filmes e música, ideias e pessoas”. Pela primeira vez, uma publicação tratava adolescentes como quase adultos. Esse período foi vital para a formação dos primeiros fã-clubes, formados por jovens que ouviam música.
A primeira edição tinha uma coluna com fofocas de estrelas de Hollywood, críticas culturais e um teste “como será seu primeiro encontro?”. O maior destaque era um ensaio fotográfico de Frank Sinatra.
Frank Sinatra durante apresentação no Royal Albert Hall, em Londres, em 1992
REUTERS/Dylan Martinez/Arquivo
O cantor e ator americano foi mais um a aumentar sua popularidade (e conta bancária) por meio de residências em Las Vegas. Por volta de 35 anos depois, ele foi protagonista de mais um momento importante da história dos megashows.
No dia 26 de janeiro de 1980, Sinatra cantou para 175 mil pessoas no Maracanã. Aquele foi o primeiro grande show produzido por um então jovem empresário, um tal de Roberto Medina.
Show de agora
No livro “Como funciona a música”, David Byrne propõe uma reflexão interessante.
O ex-líder da banda Talking Heads diz que antes as pessoas ouviam música gravada em busca da experiência de ver apresentações musicais ao vivo.
Na era dos mega eventos contemporâneos, o raciocínio se inverteu: fãs veem shows em busca da experiência que tem ouvindo música nas plataformas de streaming. Quantas vezes você não ouviu alguém reclamando que a versão ao vivo não era igual à original?
A margem para improvisos e performances mais orgânicas diminuiu. Tudo é limitado pela estrutura de iluminação, pelas interações com cenário ou pelo receio de entregar uma apresentação aquém da gravada em estúdio.
Madonna durante a abertura da The Celebration Tour na The O2 Arena, em Londres, em 14 de outubro de 2023
Kevin Mazur/WireImage for Live Nation via Reuters
Cada vez mais, é comum assistirmos a shows com bases pré-gravadas (seja de som instrumental, eletrônico, ou vocal), o que é diferente de playback, recurso de voz 100% dublada.
A própria Madonna, que durante décadas se apresentou com banda camuflada, não levará nenhum instrumentista para seu show de sábado, na Praia de Copacabana (RJ).
Assim como fez no restante da turnê “Celebration”, ela cantará sobre bases pré-gravadas. A rainha do pop subirá ao palco apenas com seu numeroso (e afinado) balé.
Madonna: 40 anos no topo do pop
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