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Enchente de 1983: memórias da catástrofe que marcou Blumenau: ‘escutava os gritos de socorro’

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Esta semana é marcada em Blumenau, no Vale do Itajaí, pela passagem de um dos episódios mais tristes da história da cidade em 172 anos. A data é difícil de esquecer: o dia 7 de julho de 1983 foi o início de um rastro de destruição incalculável.

Rio Itajaí-Açu, em Blumenau, chegou a marca de 15,34 m de altura no dia 9 de julho de 1983 – Foto: Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

O cenário há 40 anos era devastador. Boa parte da área urbana de Blumenau foi inundada. Muitas famílias ficaram desabrigadas e passaram dificuldades pela grande e duradoura enchente que assolou várias regiões de Santa Catarina na ocasião.

Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND
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Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND
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Reportagem especial do Portal ND+ relembra a enchente que marcou a história de Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

Rio Itajaí-Açu, em Blumenau, chegou a marca de 15,34 m de altura no dia 9 de julho de 1983 - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND
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Rio Itajaí-Açu, em Blumenau, chegou a marca de 15,34 m de altura no dia 9 de julho de 1983 – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

“O ano de 83 já começou dando umas dicas pra gente, começou chuvoso demais, com o rio subindo e descendo. Então começa a chover e vinha a preocupação. Estava no plantão e a chuva não parava. (…) Eu fui para casa pegar alguma coisa porque não sabia como ia ficar a partir daquele momento. Então pedi para um companheiro que ficasse no meu lugar enquanto ia em casa pegar as coisas e logo voltaria”, relembrou José Augusto Carvalho de Nóbrega, ex-secretário de Defesa Civil de Blumenau.

José conta que quando chegou em casa, o rio começou a subir e a angústia tomou conta do povo de Blumenau. “Quando passamos a rua Sete Setembro, na esquina a Paulo Zimmermann, que é um dos pontos mais baixos da cidade, eu vi a água na rua. Paramos o carro, e o rio estava chegando no esgoto, e aí eu me assustei”.

A partir daquele momento, a cidade entrava em alerta vermelho. O Corpo de Bombeiro transitava com a sirene ligada, principalmente nas partes mais baixas. Toda a ajuda era necessária e os socorristas começaram a convocar voluntários para avisar as pessoas do que poderia estar por vir. “Estava anoitecendo, a Beira-Rio, por exemplo, estava cheia de móveis, tudo debaixo da água. E os carros com sirenes já começavam a passar nas ruas chamando a atenção, mas já estava todo mundo com a orelha em pé”, contou José Augusto.

Além de Blumenau, cidades como Porto União, Caçador, Itajaí e Rio do Sul também foram duramente castigadas pela cheia que deixou marcas na história catarinense.

Porém, a solidariedade permitiu que as famílias atingidas dessem a volta por cima e tivessem fôlego para recomeçar. Mais uma vez, era preciso reerguer tudo aquilo que foi construído ao longo de uma vida e que foi levado pela água em poucos dias ou até horas.

“Blumenau sempre foi solidária, na época da enchente, a solidariedade foi impressionante, não existiu distinção de raça, todos são iguais, procurando um ajudar o outro”, pontuou José Augusto.

“Foi a maior loucura do mundo, nunca vi alguma coisa assim. Um mini hospital foi montado na secretaria de saúde da prefeitura. Com comida faltando, recebemos o risoto de salsicha que o batalhão fazia e levava em panelão. Cozinheiras voluntárias faziam comida lá na prefeitura, no bar da associação dos servidores”, complementou o ex-secretário de Defesa Civil.

1983: foi a maior enchente da história de Blumenau?

Mesmo que, para muitas pessoas, a enchente de 1983 tenha sido a pior cheia da história de Blumenau, a maior cidade do Vale do Itajaí possui uma longa convivência com as águas caudalosas do rio Itajaí-Açu.

Registros históricos da cidade apontam que a primeira enchente do município aconteceu em 1852, somente dois anos após a instalação da colônia de Hermann Bruno Otto Blumenau. Em 29 de outubro de 1852, dados da prefeitura apontam que o rio Itajaí-Açu chegou a marca de 16,30 metros acima do nível normal.

Porém, quando o assunto é o nível do rio em termos estatísticos, a maior enchente da história de Blumenau foi no ano de 1880. No dia 23 de setembro daquele, o nível do rio chegou a 17,10 m acima do nível normal e, após quase 150 anos, esta marca nunca mais foi alcançada.

Em 1911, uma nova e longa enchente também devastou a cidade, com o rio chegando a 16,90 m de altura, no dia 2 de outubro. Outras cheias consideráveis, mas que foram menores que a de 1983, aconteceram nos anos de 1980, 1975, 1973, 1961 e 1957.

Contudo, a realidade rural e interiorana da Blumenau, ainda sem indústrias ou grandes empresas, anterior à década de 1980, não permitia que os estragos ficassem tão explícitos como na tragédia de 1983.

Memórias de uma tragédia

Naquele ano, grandes parques fabris foram alagados, trabalhadores ficaram ilhados em seus locais de serviço, muitas famílias ficaram sem qualquer comunicação. A ausência quase que total de energia elétrica, falta de água potável, itens de necessidade básica, alimentação, higiene e falta de comunicação por telefone foram as principais angústias da época.

Hospitais, algumas repartições públicas, órgãos de segurança e grandes empresas ficaram a luz de velas durante a noite e, onde havia eletricidade, ela era fornecida somente a base de geradores movidos a óleo diesel.

Conforme a historiadora Sueli Petry, relatos da época davam conta que muitas pessoas ficaram ilhadas pois relutavam em subir os móveis de casa ou buscar abrigo. Blumenau não tinha nenhum sistema de alerta para cheias ou serviços meteorológicos como o hoje fornecido pelo AlertaBlu. A maior parte da população ficou ilhada, com a esperança de um recuo das águas, que não aconteceu.

Muitas famílias ficaram ilhadas na enchente de 1983, em Blumenau, no Vale do Itajaí – Foto: Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

Para o Bombeiro Militar aposentado, Juventino Werner, a catástrofe de 1983 foi um momento que marcou sua carreira. Gritos de socorro ecoavam pela cidade. Pessoas saindo pelo telhado de suas casas, carregando móveis e lembranças. “Eu lembro que alguns lugares a gente escutava os gritos de socorro. (…) A chuva era direto e cada vez enchia mais e a água tomava conta da casa inteira. Morreram muitas pessoas”.

Entre os mortos, um soldado que fez tudo o que podia para ajudar a comunidade. Enquanto tentava ajudar famílias a saírem de suas casas, o soldado Jordelino foi eletrocutado e morreu. “Trabalhando na enchente, perdi um amigo”, relembrou o bombeiro aposentado.

Da enchente de 1983, segundo Sueli Petry, não há estatísticas oficiais consolidadas do número de mortos, desabrigados, feridos ou afetados pela cheia. Porém, os prejuízos devido à chuva ininterrupta, que não deu trégua por um período de quase dez dias, são incalculáveis. Na visão da historiadora, Blumenau ficou alheia à tudo, ilhada e submersa.

A pesquisadora relembra que em 1983, ela também trabalhava como professora na rede municipal de ensino e destaca o serviço que os radioamadores montaram na busca por ilhados, transporte de mantimentos, pedidos por mais embarcações, botes ou canoas e no apoio aos órgãos de governo com comunicados oficiais, situação da chuva, previsão do tempo e deslocamento de autoridades.

Durante a enchente, o prefeito da época, Dalto dos Reis, chegou a ficar ilhado no próprio prédio da prefeitura de Blumenau, já na sede atual. O então governador de Santa Catarina, Esperidião Amin, também visitou a cidade.

“É uma recordação muito importante. Se eu não acreditasse em Deus desde pequeno, eu passaria a acreditar pela força que ele nos deu, ao povo catarinense, a mim também e todas as pessoas que nos cercaram. Porque foi muita dor, muita desgraça e muita solidariedade, além da capacidade de reconstrução que o catarinense mostrou naquele momento. Então foi um desastre muito denso, pesado e rico na história de Santa Catarina”, recordou Amin durante um evento de lançamento do Julho Laranja em Blumenau.

A história de uma cidade quase perdida

Outro papel importante desempenhado na época foram das emissoras de rádio em Blumenau, que ficaram no ar por dias seguidos, transmitindo uma única programação, chamada de “rede da solidariedade”.

“A rádio PRC-4, Rádio Clube de Blumenau, era contínua e vinha anunciando o que estava acontecendo e o desespero era muito grande. Eu lembro de uma passagem onde eu fui no telefone e pedi para um dos radialistas para que as pessoas que passassem na frente do prédio da biblioteca pública (na Alameda Duque de Caxias), que era um outro prédio diferente do atual, que levantassem os livros e que fossem ver como estava o museu. E ele me respondeu com a seguinte frase: ‘minha senhora, agora não é o momento de lembrar de livro ou de museu, a prioridade agora é salvar vidas’. E isso, para mim, foi um pêndulo, foi um desespero”, revelou Sueli Petry ao Portal ND+.

Quando as águas começaram a baixar, a então moradora do bairro Vila Nova, conta que foi a pé de casa até o Centro Histórico de Blumenau, praticamente irreconhecível. Ela disse que passou por áreas alagadas e caminhos por matagais, passando com água acima da cintura, até chegar no prédio da biblioteca e do antigo Arquivo Histórico, que era diferente do prédio onde a professora trabalha hoje.

Arquivo histórico de Blumenau também foi atingido pela enchente de 1983 – Foto: Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

Ela conta que foi desesperador entrar em um prédio totalmente aberto, sujo e repleto de pilhas de livros no chão, com estantes destruídas pela lama, assim como móveis, cadeiras, mesas e até mesmo um piano, do tempo da família colonial, completamente estragados.

Outro agravante que a pesquisadora recorda é a suspeita de vandalismo  que o local sofreu durante a enchente. Muitas peças, como quadros e obras de arte simplesmente desapareceram.

Após o incidente, Sueli Petry lembra que museólogos vieram do Rio de Janeiro para reorganizar o material que sobrou, salvos da antiga biblioteca e do antigo museu. No caso da biblioteca, o prédio antigo precisou ser até demolido, para dar lugar ao atual Arquivo Histórico de Blumenau.

Boa parte do acervo documental da colônia Blumenau, além de documentos do professor José Ferreira da Silva, somente foram salvos pois haviam sido descolados semanas antes da enchente para uma outra sala mais alta em um dos últimos andares do prédio da antiga prefeitura, no começo da rua XV de Novembro.

Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND
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Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND
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Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

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Acervo do arquivo histórico também foi atingido pela enchente de 1983, em Blumenau – Arquivo Histórico José Ferreira da Silva/Reprodução/ND

O nascimento de uma nova vida em meio a enchente de 1983

Para uma moradora de Blumenau, o dia 9 de julho de 1983, quando o rio Itajaí-Açu chegou a marca de 15,34 m de altura, foi extremamente atípico. Maria Teresa Hulse, estava à espera de seu primeiro filho e enquanto o marido ajudava os vizinhos, as dores do parto indicavam que o pequeno Levi viria ao mundo naquele dia.

Maria e o marido foram até a Rivage, pois sabiam que a médica obstétrica estava realizando alguns procedimentos no local. Porém, chegando lá, a médica disse que não seria possível fazer o parto do bebê no local. A bolsa estourou e uma força-tarefa foi organizada para ajudar a família.

“Graças a Deus existia os rádios amadores. A dona Alda fez aquele trabalho maravilhoso e entramos em contato com o exército, que tinha um helicóptero. Quando ele recebeu a chamada, ele disse que viria, mas não poderia ir nos buscar, porque era de manhã, chovendo muito e com muita neblina, mas mesmo assim ele foi. Quando nós chegamos no hospital no Santa Catarina, fui atendida de imediato e o doutor Fernando fez todos os procedimentos e o Levi nasceu”.

Levi nasceu com saúde. E depois de alguns dias, a família se reencontrou. Maria relembra que ela e o filho precisaram ir de canoa até a casa do pai. “Ao meio-dia de 12 de julho de 1983, nós três nos encontramos, eu, meu marido e o Levi. Meu agradecimento eterno a dona Alda, ao radioamador de modo geral, ao exército que fez e faz esse trabalho maravilhoso”.

Hoje, 40 anos depois, Levi mora em Caçador, no Meio-Oeste de Santa Catarina. “Completar os 40 anos em um momento em que Blumenau passou por várias dificuldades, que foi a grande enchente de 83, é uma grande emoção porque é uma cidade que terminou se transformando com essas enchentes, que se tornou cada vez mais resiliente e eu faço parte dessa história”, enfatizou Levi Hulse.

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