Após estrear seu primeiro longa-metragem em língua inglesa, Firebrand, sob aplausos em Cannes, Karim Aïnouz voltou às salas de cinema na semana passada com dois documentários: Marinheiro das Montanhas e Nardejes A. Ambos trazem um olhar pessoal do cineasta, um dos mais prestigiados do Brasil, sobre a Argélia, país em que os pais se conheceram.
Marinheiro das Montanhas, ovacionado por 15 minutos em Cannes em 2021, narra a jornada do cineasta pelo país africano, onde investiga a história do pai, um homem que só conheceu por fotografias, para compreender as suas próprias origens.
O documentário é todo narrado por Karim, em forma de uma carta para a já falecida mãe, Iracema, que ocupa o lugar de uma companheira imaginária de viagem. Enquanto relata e comenta episódios da jornada, o diretor reativa memórias familiares e revela os muitos sentimentos contraditórios que marcam o seu percurso.
Marinheiro das Montanhas
Marinheiro das Montanhas é um diário de bordo realizado na primeira viagem do cineasta ao país de origem de seu pai, a Argélia
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Marinheiro das Montanhas 2
. O processo de conclusão do projeto se deu durante a pandemia, quando o diretor se debruçou sobre o material filmado em janeiro de 2019, data da sua travessia de barco pelo Mar Mediterrâneo até o país, antes de seguir até Cordilheira do Atlas, no norte da nação africana
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Nardjes A
Filmado em 8 de março de 2019, Nardjes A. retrata um dia na vida da ativista enquanto ela se junta aos milhares de manifestantes nas ruas de Argel
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Karim Aïnouz realizou a produção de NARDJES A. durante as manifestações que tomaram conta da vida política da Argélia, em 2019
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Karim Aïnouz durante homenagem no Cine Ceará em 2019
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Já Nardejes A., filmado em em 2019, durante a pré-produção de Marinheiro das Montanhas, acompanha um dia na vida de uma ativista enquanto ela se junta aos milhares de manifestantes que vão às ruas para derrubar o regime que os silenciou ao longo de décadas.
Com um smartphone na mão, o diretor faz um retrato íntimo de uma ativista que luta por um futuro democrático no país. Em meio a crises globais, o documentário simboliza o ardor das jovens gerações de 2020 que invadiram as ruas exigindo tempos melhores em todo o mundo.
Filmes que falam de esperança
Em entrevista ao Metrópoles, Karim Aïnouz explicou que a decisão de fazer um lançameno simultâneo se deu por causa das similaridades dos dois longas, que vão além da ambientação.
“São filmes que foram feitos meio que simultaneamente e falam de um mesmo tema, a emancipação, a revolução, a insurreição. E, no mesmo contexto, um fala disso há 60 anos, que foi o pico da libertação da Argélia, e o outro fala do que está acontecendo na Argélia no momento que eu fui fazer filme atrás do passado e se impôs pra mim de maneira muito forte”, explica Karim Aïnouz.
“Então eu acho que são filmes que falam do mesmo tema, que se passam no mesmo lugar e foram feitos aproximadamente na mesma época. Então eu achei que fazia sentido que eles se complementam. É o mesmo tema, um olhando para o passado e o outro para o futuro”, conta o diretor.
O cineasta também cita a empolgação de ver o cinema voltar a ser frequentado pelo grande público no Brasil. “Eu acho que a gente precisa, depois de anos tão difíceis, estimular o espectador para voltar ao cinema (…) Os dois filmes falam de esperança e eu acho que a gente vive uma situação onde a esperança está contaminando a gente de novo. Então acho que é importante dar uma dose dupla de esperança para o público”.
Para além do lançamento duplo, Karim está na fase final das filmagens de Motel Destino, no Ceará, e se prepara para rodar o seu segundo longa internacional, Rosebushpruning, com Kristen Stewart, Elle Fanning e Josh O’Connor no elenco. Ele explica que a sequência de trabalhos também está relacionada à mente inquieta e apaixonada pelo ofício.
“Quando eu comecei a fazer cinema, nunca achei que ia fazer cinema. Eu me lembro que a minha mãe uma vez me perguntou o que eu queria fazer e eu respondi ‘fotografia’. Ela disse que era muito caro, revelar um filme e tal. E hoje quando eu penso que eu faço 24 fotos por segundo…”, reflete.
“É que eu venho de uma geração que levava tudo muito tempo, não havia instituições que pudessem tá ali com a gente, vontade política… Eu me lembro que fazer Madame Satã levou dez anos, sabe? Então acho que hoje em dia eu devoro cada possibilidade que eu tenho, cada oportunidade que eu tenho de fazer um filme. Claro que eu sou um, tem horas que dá vontade de ser cinco, pra fazer ainda mais. Mas eu acho que é isso. Eu acho que o meu sonho de fato é poder talvez tentar fazer uma espécie de filme por ano assim”, completa Karim.
