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PEC inclui criminalização de porte de drogas na Constituição, mas não muda punições; entenda

O Senado aprovou na noite de terça-feira (16) uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que criminaliza o porte e a posse de drogas em qualquer quantidade.
O texto prevê que as leis brasileiras deverão considerar as duas condutas como crimes. O mecanismo é introduzido pela PEC dentro do artigo 5° da Constituição, que estabelece os direitos e garantias individuais dos brasileiros.
Pela proposta, deverá haver distinção entre traficante e usuário — o que já ocorre, com base na Lei de Drogas, em vigor desde 2006.
Em outra repetição do teor da legislação de 2006, a PEC determina que o usuário terá penas alternativas à prisão, como prestação de serviços sócio-comunitários, comparecimento a cursos etc.
Então o que muda, na prática? O entendimento, compartilhado por juristas e parlamentares ouvidos pelo g1, é que o texto da PEC derrubaria jurisprudências — interpretações jurídicas — anteriores e futuras que flexibilizam sanções jurídicas ou administrativas aplicadas a condenados por porte de drogas para consumo.
Ou seja: a PEC deixa bem claro que essas punições têm que ocorrer, independente de qualquer critério. Só com base na Lei de Drogas, poderia haver um entendimento mais flexível sobre as sanções para usuários. Um juiz poderia entender que, pela pequena quantidade, não deveria prosseguimento do caso e aplicações das penas alternativas, por exemplo.
A proposta aprovada no Senado é uma reação de parlamentares a um julgamento, em curso no Supremo Tribunal Federal, que discute a constitucionalidade de um trecho da lei de 2006. O caso pode descriminalizar o porte de maconha, em pequena quantidade, para uso pessoal. Os ministros definiriam qual quantidade máxima de maconha seria tolerada.
Na opinião de especialistas, com a PEC o Congresso “amarraria” o STF e tornaria inconstitucional eventual decisão do julgamento no sentido de descriminalizar a conduta da pessoa pega com pequena quantidade de maconha.
Tanto juristas quanto parlamentares avaliam que, se a PEC for aprovada e promulgada pelo Congresso, há chances altas de o texto ser questionado no Supremo. Os argumentos são de que a proposta viola direitos fundamentais, considerados cláusulas pétreas da Constituição, que não podem sofrer alterações por emendas.
“A PEC das Drogas tenta constitucionalizar a criminalização do usuário. A estratégia é enfrentar eventual decisão do Supremo no sentido de que a criminalização do usuário seria inconstitucional”, afirmou o professor e advogado criminalista Pierpaolo Bottini.
Esta reportagem vai responder às perguntas abaixo, para esclarecer o alcance da PEC.
Como são diferenciados o usuário e o traficante de drogas hoje e o que muda com a PEC?
Quem decide qual o enquadramento de cada caso e o que muda com a PEC?
Quais drogas são criminalizadas e o que a PEC muda?
Quais são as penas aplicáveis a usuários e traficantes, e o que muda com a PEC?
O enquadramento como usuário vira antecedente criminal? O que a PEC muda?
Qual a relevância da PEC para o julgamento no STF? Qual a diferença?
Como são diferenciados o usuário e o traficante de drogas hoje e o que muda com a PEC?
Lei de Drogas
A Lei de Drogas prevê uma distinção entre traficante e usuário de drogas. Na prática, a legislação de 2006 despenaliza (exclui possibilidade de prisão) o consumo das substâncias, mas prevê que o porte de entorpecentes para uso pessoal — isto é, carregar a droga consigo —- pode ser punido.
Em linhas gerais, o tráfico leva à prisão, e o porte para consumo não.
Pelo texto em vigor, é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal. A prática não é punida com prisão, mas com penas alternativas, como advertência, prestação de serviços comunitários e comparecimento a cursos educativos.
O tráfico, por sua vez, é definido como a conduta de quem, por exemplo, vende ou fabrica o entorpecente. A pena é de até 15 anos de prisão.
Para diferenciar o consumo pessoal do tráfico, a lei estabelece que a Justiça deve considerar a quantidade, o local e as circunstâncias do caso. Em ocorrências pelo país, por exemplo, as autoridades também consideraram o tipo de droga que estava com a pessoa. Não há critérios objetivos que servem de guia para essa avaliação.
PEC
Na prática, a PEC aprovada nesta terça pelo Senado não altera em nada o que já está definido pela legislação. Critérios objetivos não são definidos.
Ao criminalizar o porte e a posse, o texto mantém que, em todos os casos, deverá haver “distinção entre traficante e usuário por todas as circunstâncias fáticas do caso concreto”. Também segue a possibilidade de aplicação de penas alternativas ao usuário.
Quem decide qual o enquadramento de cada caso e o que muda com a PEC?
Lei de Drogas
Pela legislação, a diferenciação cabe aos Juizados Especiais Criminais, a quem cabe julgar a prática. Juristas afirmam, porém, que muitas vezes o filtro já é feito pela polícia que flagrou a pessoa com droga.
A polícia é responsável por levar, no caso do porte para consumo, o usuário a assinar um Termo Circunstanciado de Ocorrência.
O usuário de droga não poderá ser preso em flagrante. A recusa em assinar o termo também não pode levar a pessoa à prisão.
A diferenciação entre o consumo pessoal e o tráfico deve levar em conta, por exemplo, a quantidade, o local e as circunstâncias do caso. Não há critérios objetivos que servem de guia para essa avaliação.
PEC
A PEC não diz a quem cabe analisar os casos. Na prática, portanto, não altera em nada o que já está definido pela lei.
O texto diz que, em todos os casos, deverá haver “distinção entre traficante e usuário por todas as circunstâncias fáticas do caso concreto”. Também segue a possibilidade de aplicação de penas alternativas ao usuário.
Para entidades de direitos humanos, ao não avançar na diferença objetiva entre usuário e traficante, a avaliação se torna subjetiva. Isso, segundo as organizações, tem elevado o número de pessoas presas por portar drogas, principalmente negras.
Quais drogas são criminalizadas e o que a PEC muda?
Lei de Drogas
A legislação atual não indica textualmente quais drogas são consideradas ilícitas no país. Pela Lei de Drogas, são consideradas proibidas as drogas “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.
Cabe à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinar quais substâncias são consideradas estarão sujeitas a controle. Na lista, estão inscritos, por exemplo, a cocaína e plantas que podem originar substâncias entorpecentes, como a cannabis.
PEC
A PEC não faz qualquer alteração a isso.
Quais são as penas aplicáveis a usuários e traficantes, e o que muda com a PEC?
Lei de Drogas
A Lei de Drogas prevê uma distinção entre traficante e usuário de drogas. Na prática, a legislação de 2006 despenaliza o consumo das substâncias, mas prevê que o porte de entorpecentes para uso pessoal — isto é, carregar a droga consigo —- pode ser punido.
Em linhas gerais, o tráfico leva à prisão, e o porte para consumo não.
Pelo texto em vigor, é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal. A prática não é punida com prisão, mas com penas alternativas, como advertência, prestação de serviços comunitários e comparecimento a cursos educativos.
O tráfico, por sua vez, é definido como a conduta de quem, por exemplo, vende ou fabrica o entorpecente. A pena é de até 15 anos de prisão.
PEC
Na prática, a PEC aprovada nesta terça pelo Senado não altera em nada o que já está definido pela legislação.
O enquadramento como usuário vira antecedente criminal? O que a PEC muda?
Lei de Drogas
Ao ser levado a assinar o Termo Circunstanciado de Ocorrência, a conduta da pessoa fica registrada no arquivo dos órgãos de segurança pública, o que leva ao registro em ficha criminal.
No entanto, isso não significa que haverá existência de antecedentes criminais, o que depende de condenação criminal.
PEC
A PEC não muda nada disso.
Também não altera os procedimentos relacionados à prática no Juizado Especial Criminal. Por lá, é permitido o mecanismo da transação penal, um acordo firmado entre o MP e o acusado, para encerrar e arquivar o processo. Nesse mecanismo, a pessoa aceita a cumprir pena de forma imediata.
A transação penal não leva à condenação, o que afasta os registros criminais. Apesar disso, o beneficiário fica impedido de firmar novo acordo dentro do prazo de cinco anos.
O descumprimento dos requisitos estabelecidos no acordo permitem que o MP reinicie o processo e ofereça denúncia contra o acusado. Segundo o professor e especialista em direito criminal Thiago Bottino, isso poderá levar à condenação e eventual inscrição da conduta na ficha de antecedentes criminais.
Qual a relevância da PEC para o julgamento no STF? Qual a diferença?
Neste momento, a PEC não influenciará o julgamento do STF que trata da descriminalização do porte de maconha. O texto ainda precisa ser submetido à análise da Câmara dos Deputados e, depois disso, promulgado pelo Congresso.
Se aprovado e promulgado pelas duas Casas antes do término do julgamento, o teor da PEC deverá ser considerado pela Corte durante a análise do caso, segundo juristas.
Para uma ala de especialistas, isso poderia implicar, por exemplo, que não deverá haver consequências distintas entre tipos e quantidades de drogas, derrubando toda a discussão feita pelos ministros até agora.
No julgamento, o STF discute a constitucionalidade do artigo da Lei de Drogas que estabelece como crime o porte de drogas para uso pessoal. Cinco ministros já votaram no sentido de descriminalizar somente o porte da maconha, excluindo anotações de antecedentes criminais, mas mantendo a possibilidade de aplicar penas alternativas à prisão aos usuários.
Os ministros também discutem a definição de um marco (em peso) para classificar uma determinada quantidade de maconha como de uso pessoal. A medida seria um marco em toda a atual legislação de drogas, que não traz critérios objetivos para isso.
Num cenário em que o texto da PEC passe a integrar a Constituição, em uma análise simples, o STF não poderia declarar o trecho da Lei de Drogas como constitucional.
Apesar do avanço da PEC, parlamentares e juristas avaliam que, em uma eventual promulgação, o texto deverá ser questionado judicialmente no próprio STF. O argumento é que o teor da proposta fere cláusulas pétreas da Constituição, que não podem ser alteradas por emendas.
“A discussão do Supremo é relevante, porque o princípio da dignidade humana, no qual os ministros têm fundamentado suas decisões, é uma cláusula pétrea. Não pode ser alterado por proposta de emenda condicional. Portanto, alteração promovida pelo Senado não afetaria as conclusões do Supremo Tribunal Federal”, avaliou Bottini.
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